
Sendo um francoatirador de esquerda, nunca deixei de me preocupar com os destinos do mundo e o combate constante e solidário por uma justiça que evito adjetivar. Foi uma vocação precoce que espero manter enquanto souber fazê-lo. Por isso sempre procurei combinar o interesse pelas coisas belas e reconfortantes do mundo – uma música exaltante, um livro que nos desafia, um poema que canta, uma mulher bonita, um rio selvagem, uma nuvem carregada que anuncia o outono – com uma noção de compromisso que, com Camus, associo sempre às escolhas que todos os dias nos vemos condenados a fazer. Nesta medida, sempre afastei, por vezes até com alguma repulsa, a proximidade dos que apenas olham uma flor, ou só se vêm ao espelho, enquanto desviam o olhar e o corpo do sofrimento dos outros, do ódio e da opressão que fazem parte da vida, tentando simular que eles não existem. Aborrece-me muito, por vezes de morte, quem fala apenas de política, mas incomoda-me quem se recusa a olhá-la. Uma e outra posição marcadas, no fundo, por uma falta de humanidade que elide a complexidade das coisas e das pessoas, reduzindo-a, obsessivamente, apenas a um dos seus lados. ler mais deste artigo