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Brinquinho madeirense

brinquinho

De vez em quando é necessário escrever sobre temas que nada trazem de novo, que apenas relembram verdades conhecidas, limitando-se a dizer o óbvio e a fazer ecoar o que já todos sabem. Este post vai ser assim, pois vai falar da Madeira e de Alberto João Jardim, assunto sobre o qual já se disse e já se escreveu tanto que se tornou real e virtualmente impossível inovar grande coisa. Além disso, episódio algum pode surpreender e criar uma situação sobre a qual poderemos lançar um novo olhar, pois nada do que possa ocorrer espantará quem não tenha acordado agora de um coma prolongado ou chegado de uma estadia em Marte.

Li e concordo parcialmente com um post do Daniel Oliveira saído no Arrastão («Responsabilizar criminalmente Jardim pela dívida é desresponsabilizar a democracia»). Penso também que a situação madeirense não é da responsabilidade única da clique partidária instalada na ilha ou dos seus mansos patronos (e patrocinadores) de Lisboa, implicando igualmente uma legitimidade democrática que corresponsabiliza a larga maioria do eleitorado regional. Aceito ainda que em determinadas circunstâncias – e muito em particular nas atuais – reeleger o arruaceiro da Quinta Vigia converte os eleitores da Madeira em «cúmplices de um crime.» Que face aos dados esmagadores dos quais dispomos agora, confirmar nas urnas a continuidade do primeiro responsável pela prática continuada de um crime público altamente doloso é partilhar com ele a responsabilidade pelos seus atos e pelas pesadas consequências que transportam consigo.

Só que, em parte porque conheço razoavelmente a Madeira e observo os madeirenses para além do que o fazem os continentais-«cubanos» vulgares de Lineu – nos últimos trinta anos, por razões familiares, tenho conservado uma intensa ligação à ilha que me permite ter dela e dos seus habitantes uma mais completa perspetiva de insider –, tenho uma perceção particularmente aguda do modo como as condições objetivas em que decorre a vida social e política do arquipélago impossibilitam a compreensão, pela larga maioria dos seus moradores, desse grau de gravidade e de cumplicidade. As razões são múltiplas e por isso limito-me a anotar as mais óbvias. (mais…)

    Atualidade, Opinião

    O Queer Lisboa e Israel

    lbgtisrael

    O mínimo que se pode dizer da decisão da organização do Queer Lisboa 15, o festival de cinema gay e lésbico já a decorrer neste fim de semana, no sentido de, por pressão do movimento Panteras Rosa e do Comité de Solidariedade para com a Palestina, se recusar a ter entre os apoiantes a Embaixada de Israel – à qual, como é óbvio, havia previamente pedido o apoio que agora declinou – é que se trata de um gesto deplorável. Por certo que um eventual apoio das embaixadas da França ou da Itália, cujos governantes não são propriamente defensores das causas dos povos ou das minorias, não seria posto em causa. E sabendo que, por muito que a política externa e interna israelita seja agressiva e injusta, e (sublinhe-se) neste momento é-o de facto, tal não invalida que Israel seja um país onde se realizam eleições livres, onde se exerce uma mais do que razoável liberdade de expressão, onde os movimentos LBGT são fortes e livres de atuarem, e onde existe até uma oposição cada vez mais visível que se bate por uma sociedade mais justa e multiétnica. Coisa que, como é sabido, nem mesmo após as recentes «primaveras árabes» está minimamente garantido na generalidade dos Estados vizinhos, onde gays e lésbicas são brutalmente perseguidos pelo facto de o serem. A única explicação é, a meu ver, um não-assumido antissemitismo (e antissionismo) que culpa Israel por existir. Não-assumido, repito, o que piora as coisas.

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      Noventa dias

      direitaesquerda

      Sempre me pareceu, ainda o executivo de José Sócrates palmilhava alegre e impante as estradas de Portugal, que o ramerrão de certa esquerda de acordo com o qual PS e PSD são «as duas caras da mesma moeda», não sendo inteiramente falso em termos de macropolítica, projetava um enorme equívoco. Queiramos ou não, foi esta perceção, ainda que expressa de forma ligeiramente mais elaborada, que levou parte dessa esquerda a assinar de cruz a condenação à morte do anterior governo, projetando, numa atitude de contranatural cumplicidade, a mais do que previsível vitória da coligação que sustenta o atual. Foi insensata, pueril e profundamente danosa essa escolha. O governo do PS seguiu, é certo, caminhos ínvios e sinuosos, incapaz de escapar a pressões externas e ao manobrismo da parte mais insana do seu próprio aparelho, inábil para projetar uma política inteligente, independente e corajosa que permitisse buscar um caminho coerente, eficaz e socialmente aceitável no crítico contexto internacional que já se vinha desenhando. Mas bastaram noventa dias de governo PSD-CDS para se notar a diferença, para bem pior, em áreas cruciais. Independentemente do que foi preciso e possível negociar com a troika, das condições em que o anterior governo rosa teria também de ceder em algumas coisas – e fá-lo-ia com toda a certeza –, este, azul-laranja, tem aproveitado para «ir mais longe». Um «mais longe» que não é senão, em áreas críticas como a saúde, o ensino e a solidariedade social, o tentar aplicar em poucos meses, numa lógica de irreversibilidade, o programa que desde 1974 a direita e o patronato mais mesquinho e ultramontano jamais foram capazes sequer de propor. Os trabalhadores, as mulheres, os jovens, os idosos, a classe média, a quem estão a empobrecer e a retirar às cegas direitos absolutamente fundamentais, a quem em nome de um «saneamento financeiro» injusto e sem horizonte estão a roubar a esperança, que o digam.

      Nota escrita a posteriori: Este post teve algum feedback na bloga. A maior parte limita-se a registar ou a acentuar a «originalidade» da posição de alguém que foi e permanece muito crítico do PS dos anos de governo. Outra, porém, vê nele uma declaração de apoio a este partido, coisa que só pode «ler» quem de facto só lê aquilo que quer ou não sabe pensar se não a branco e vermelho. Ou então não entende que qualquer mudança política que venha a reconduzir a direita ao seu lugar passa por um debate entre os socialistas e um diálogo efectivamente paritário com eles. E por alterações nas atitudes de irredutibilidade política que roçam a teimosia. Em alguns casos, um pouco tristes, a estupidez.

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        Guerra e cumplicidade

        isto não é ficção

        A crítica contemporânea da velha ideia de «guerra justa» apoia-se com frequência num erro grosseiro. Parte de um princípio fácil de reconhecer por quem da vida social tenha uma perspetiva não contaminada pela paranoia da violência: todas as guerras são más, todas são devastadoras, todas provocam sofrimento, todas deixam um rasto traumático de medo, perda, mutilação e morte. Por isso, considera essa crítica que absolutamente tudo deve ser feito para que sejam evitadas ou para que cessem. Mas atrapalha-se num equívoco capaz de contrariar as melhores intenções quando sublinha, fundada nos valores do relativismo cultural mais inflexível, a impossibilidade de aplicar à violência armada diferenciados graus de ética e de justiça. Considera então que o justo para uma das partes envolvidas não o é necessariamente para a outra, e, em consequência, desconfia de quem se proponha estabelecer critérios que graduem responsabilidades na aferição do mal.

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          Atualidade, História, Olhares, Opinião

          Não há revoluções perfeitas

          Não há revoluções perfeitas e ainda bem que assim é. As revoluções imperfeitas que procuraram fazer-se passar por perfeitas transformaram-se rapidamente em instrumentos de uma ordem social imposta, tendencialmente despótica, crescentemente violenta e opressiva, que de revolucionário manteve apenas o rótulo e a retórica. Aconteceu com todas aquelas que irromperam depois de deixarem amadurecer os «grandes princípios» e os programas que deveriam ser aplicados com mão de ferro após a vitória da nova ordem. Aconteceu como a francesa, a russa, a chinesa ou a iraniana. Por isso são sempre mais admiráveis as revoluções inacabadas, como a portuguesa, a checa ou a egípcia, que nasceram de princípios vagos e sem um programa claro, que apenas prepararam o terreno para uma mudança de longo curso, inevitavelmente complexa e contraditória, a percorrer em ziguezague, que só a realidade vivida poderia ou poderá ditar.

          O que importa nas revoluções imperfeitas é pois o instante, o ponto de viragem, o momento de fuga em relação ao passado, a possibilidade de transformar, a consciência de se viver um tempo rigorosamente único de libertação colectiva de uma ordem injusta e indesejada. O que nelas conta é acima de tudo, e talvez exclusivamente, o voltar anárquico da página. Por isso, antes a projecção da esperança e a consciência da possibilidade da mudança – ainda que esta vá alterando os sentidos, e possa trazer consigo muita desilusão – do que o conformismo e a inacção perante as tiranias bloqueadas. Ou a expectativa de um sinal que mostre o momento ajustado para a tal revolução exemplar, feita com os aliados absolutamente certos e em nome da inquestionável «linha justa». É nisto que deveriam pensar um pouco os cépticos crónicos das revoluções desprogramadas, para quem, como na popular chula do Minho, «p’ra pior já basta assim». Estou a falar da Líbia, obviamente.

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            Responsabilidade ou servidão

            Na Genealogia da Moral, Nietzsche evoca a «longa história das origens da responsabilidade» para mostrar como esta categoria foi impondo uma disciplina do dever que tornou previsível o comportamento humano. Sob esta perspectiva, ela pode traduzir uma forma de sujeição moral que reduz a margem de liberdade e transforma o indivíduo num ser conformista. No entanto, as coisas não precisam ser necessariamente assim: o «homem da mais vasta responsabilidade», capaz de construir a sua própria ética através da vontade, pode, para o filósofo, caminhar no sentido contrário, promovendo as suas próprias regras como um acto de liberdade. A dissociação entre responsabilidade e conformismo será aliás, décadas depois, particularmente sublinhada pelos existencialistas. Sartre projectou em 1946 a conhecida tirada a propósito do ser humano estar condenado a ser livre: «condenado porque não se criou a si próprio; e, no entanto, livre, porque uma vez lançado ao mundo, é responsável por tudo quanto fizer». Liberdade e responsabilidade aproximar-se-ão assim num núcleo ético que determinará o comportamento de muitos dos elementos de uma geração, a saída dos horrores da Segunda Grande Guerra e da experiência do «totalitarismo ideológico», à procura de um novo conceito de empenhamento cívico e de independência moral. Em The Burden of Responsability, significativamente traduzido na edição francesa por La Responsabilité des Intellectuels, um livro sobre a intervenção autónoma e a contracorrente de Blum, Camus e Aron, Tony Judt lembra a relação desta forma de entender a «escolha responsável» como uma atitude de compromisso de cada um para com os outros, mas também para consigo mesmo.

            Obviamente, nada disto é tomado em linha de conta pelas figurinhas que, diante do espectáculo terrível dado pelas hordas de pré-adolescentes lançados em actos de violência nas cidades inglesas – e presumivelmente em outras, apenas à espera da oportunidade – vêm agora para os jornais e televisões falar de uma «responsabilidade» que para elas é sinónimo de obediência e de respeito unívoco pelos valores mais tradicionais proclamados no domínio da acção do Estado, da família, das igrejas ou das instituições militares. Que existe um crescente défice de responsabilização social na atitude de muitas pessoas jovens na sua relação com os outros pode até ser verdade. É inegável o alastramento de uma geração de cidadãos que nasceu e cresceu, em numerosos casos, a diferir constantemente para os outros – para os pais, a escola, o Estado, os patrões, no limite para a polícia e os tribunais – a gestão da sua própria vida. Mas este não é seguramente o caso da maioria esmagadora destes jovens em incontrolada fúria, os quais, obviamente, não nasceram em berço de ouro ou em famílias que de tanto os protegerem ou os ignorarem os transformaram em criaturas «irresponsáveis» cujo lugar é uma casa de correcção. As razões são aqui, com toda a certeza, muito mais complexas. É fácil, no entanto, vir agora com o ladainha da responsabilidade, ou da ausência dela, para legitimar atitudes autoritárias que muitos destes psicólogos sociais de pacotilha estão desejosos de ver colocadas em prática, se necessário com o uso da força, por aquelas que proclamam como as «instituições fundamentais da sociedade». Retomando a acepção sartreana, se «o homem é condenado a se fazer homem, a cada instante de sua vida, pelo conjunto das decisões que adopta no dia-a-dia», pode dizer-se que, contrariando-a, esta gente deseja que as coisas avancem no sentido inverso. Que o ser humano se «faça homem» tornando-se mudo e obediente. Este não pode ser o caminho para resolver o enorme problema que temos em mãos.

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              Erva no asfalto

              London 2011

              Com uma vocação natural para tomar o partido dos mais fracos, tenho dificuldade em orientar-me quando tento perceber de que lado estão os bons e os maus nos motins que incendeiam a periferia de Londres e de outras cidades inglesas. Mas porque a vontade de justiça não é impeditiva de pensar um pouco, contorno a perspectiva simplista que tende a explicar o que está a acontecer desculpabilizando «os miúdos» bons – que por impulso partem, batem, queimam ou roubam – e apontando o dedo acusador apenas ao «sistema» mau, que os remete sem remissão para essa fila do fundo de onde procede a revolta.

              Existe, claro, um ambiente de injustiça social que empurra aqueles rapazes – quase só rapazes, já repararam? – para a ira desmedida e sem desígnio perceptível. Como existe o problema dos lojistas remediados, dos trabalhadores anónimos, dos imigrantes à procura da sobrevivência, que vêm o seu ganha-pão e os seus pertences volatilizados por pessoas das quais se distinguem apenas pelo facto de possuírem um trabalho, um pequeno negócio, acesso a uma vida sóbria mas digna. Não pode excluir-se, evidentemente, a teoria do sintoma, que nos fala sempre do fumo que nasce do fogo, que insiste em que a revolta resulta do medo de um futuro que não pode ser vislumbrado com esperança. Como também não pode esquecer-se o efeito de imitação, que transforma a violência gratuita em exemplo a copiar. Ocorre aqui, de facto, uma «culpa sistémica», partihada, provocada por políticas que empurram tantos jovens para a falta de perspectivas, a miséria material, o bloqueio moral, o desrespeito do outro.

              Mas existe também uma outra qualidade de culpa que deve ser imputada aos governos, aos partidos que disputam o poder, ao sistema escolar, até aos sindicatos, que, predominantemente preocupados com quem consome, com quem vota, com quem trabalha ou está em vias de o fazer, com quem paga impostos e por isso «conta», se têm muitas vezes esquecido dos marginados, dos precários, dos imigrantes, dos excluídos, principalmente jovens, que têm crescido sozinhos, à toa, «fechados na rua», como uma erva daninha, sem que ninguém se preocupe muito com ela enquanto não começar a invadir o asfalto. Foi isto, parece, que agora aconteceu. E da pior forma possível.

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                Ser, não-ser e parecer

                parecer

                A resolução do Conselho Académico da Universidade Católica sobre esse dress code mínimo pelo qual, em proveito da sua dignidade corporativa, são responsáveis professores e alunos, encerra contornos inquietantes. Ela visa banir dos espaços e instalações da instituição os «modos de trajes e formas de apresentação próprias de local de lazer e de desporto», sugerindo, como instrumento de controlo, que «todos os responsáveis pela salvaguarda do ambiente e da imagem da universidade nas suas instalações e no espaço do Campus universitário, devem chamar a atenção dos que se apresentarem de maneira imprópria». Ocorre aqui, desde logo, uma dimensão normativa que colide com a liberdade individual. Ela até pode ser aceitável em quartéis ou prisões, mas não em locais públicos frequentados por pessoas que podem entrar e sair dos espaços sob a alçada do código sem qualquer coacção. Não se percebe, além disso, a quem se aplica, dado que os cidadãos atingidos pela medida podem ser até convidados vindos de outras universidades, de outras culturas, ou simples cidadãos em viagem de férias mas interessados numa conferência ou numa exposição. Pode ainda afrontar identidades pessoais ou colectivas, ostracizadas por «impropriedade» daqueles que transportem no corpo os seus sinais «aviltantes».

                O que mais importa aqui não é, porém, o caso em si, mas sim a tendência que ele sinaliza. A insinuação da cultura antidisciplinar, nascida nos Estado Unidos na década de 1950, e que dominou o ocidente por mais de vinte anos, traduziu-se, entre outros aspectos, na apropriação de estilos de vida, modalidades de gosto, padrões de vestuário, códigos de comportamento, cambiantes gestuais, linguagens, definidos como uma espécie de prolongamento, no que à vida pessoal dizia respeito, das «estradas da libertação» então abertas. De Lisboa a Praga, ela perturbou particularmente os regimes fechados e autoritários, para os quais a emancipação e a diversidade do parecer – da cor da camisa ao corte das calças e do cabelo – constituíam uma marca de intolerável rebeldia. Para os insurrectos, por sua vez, ela era um sinal identitário, um modo de perturbação da ordem cultural, social e ética que visavam contestar. Não será, por isso, por um acaso que, nestes tempos nos quais passou a ser sinal de boa política a correcção da desordem utópica produzida e propagada durante os sixties, o resgate do fato-e-gravata se imponha como aspecto de um «regresso à ordem». Alguns pedagogos do Estado Novo falavam das universidades como lugares de formação de um «escol de mandantes». Este processo de diferenciação social passava então por uma normalização rigorosa da economia do parecer. Felizmente os tempos são outros e estes círculos já deixaram há muito de deter capacidade para imporem o seu modelo de regulação. Mas teimam em cumprir o papel de difusores de uma concepção de elite – do saber e de poder – destinada a demolir a ideia de liberdade e de igualdade que fundamenta a civilidade democrática.

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                  Memória dos tempos que hão-de vir

                  T. Roszak

                  Quem se interesse por perceber o percurso dos velhos sixties, superando a visão nostálgica ou aquela que se lhe opõe, tomando-os como um desperdiçado tempo de desordem e retrocesso, ouviu por certo falar de um livro chamado The Making of a Counter-Culture, subintitulado Reflections on the Technocratic Society and Its Youthful Opposition, e que foi publicado logo em 1969, ainda os sons de Woodstock ressoavam vagamente pelos ares. Nesta obra, como tantas outras mais citada do que lida, o professor californiano Theodore Roszak abordou a origem americana, rapidamente alargada aos ambientes urbanos das sociedades dos países capitalistas avançados, da contracultura como ferramenta da ruptura e da contestação cultural, e como instrumento de rejeição da tirania imposta pelo sistema educativo e pela autoridade familiar produzidos pelo triunfo histórico do capitalismo. (mais…)

                    História, Memória, Opinião

                    Os dados estão lançados

                    BE

                    À hora a que termino estas linhas deve ter acabado já o encontro aberto do Fórum Manifesto destinado a debater o passado recente e o futuro do Bloco de Esquerda. Sou um daqueles seus votantes e/ou simpatizantes – com a presunção de aqui pertencer a uma maioria – que não fora a presença forte desta corrente muito dificilmente se teria conservado nessa qualidade por mais de uma década a fio. O reconhecimento desta proximidade acaba, aliás, de ser confirmado pelo documento que serviu de ponto de partida para o debate de hoje, uma vez que me revejo no essencial da sua análise da actuação recente, das debilidades, das forças e das necessidades imediatas do partido. Discordo de pouca coisa, anotando apenas a falta de uns quantos temas que me parecem decisivos, entendendo essa ausência como motivada pelo desejo de «unir em vez de dividir». Mas como sou daqueles que reconhece também a necessidade de, em alguns momentos, «dividir para unir», ou mesmo «para reinar», aqui fica, embora a destempo, o meu pequeno contributo. (mais…)

                      Atualidade, Olhares, Opinião

                      Euro-eunucos

                      Monsieur Barroso
                      imagem retirada daqui

                      Da crónica de Miguel Sousa Tavares no Expresso deste sábado («O voo dos abutres»):

                      «(…) Por sorte deles [os abutres americanos das agências de notação], encontraram em Bruxelas uma cambada de eunucos, uma colecção de políticos sem nenhuma visão política de futuro, aterrorizados pelas opiniões públicas locais e as suas conjunturas eleitorais, um clube de cobardes sem alma nem grandeza, que irão dar cabo da mais fascinante ideia política desde o pós-guerra, que é a da unidade europeia. Aquele triste ajuntamento de cromos fotográficos não percebeu ainda que está sob ataque concertado e ajoelha-se perante a ofensiva de três agências americanas que estiveram directamente envolvidas no eclodir da crise mundial, ao acompanharem o irresponsável senhor Greenspan, ex-presidente da Reserva Federal americana, e o idiota do ex-Presidente Bush na cobertura do mais inacreditável roubo alguma vez cometido na história da economia — que foi o roubo da economia americana por parte do seu sector financeiro, com consequências que sobraram para o mundo inteiro. Estes tipos que, com o seu aval, permitiram que os Madoffs e os Lehman Brothers roubassem as poupanças e a confiança dos que trabalharam uma vida inteira para terem a sua reforma e a sua casa; que, lá de longe, assinaram a falência de milhares de empresas do mundo inteiro e condenaram dezenas de milhões de trabalhadores ao desemprego, agora exigem que Bruxelas assine por baixo que uma nação com quase nove séculos de história, como Portugal, seja lixo, e uma nação, como a Grécia, que fundou a Europa e que fundou a democracia e a civilização mediterrânica, há dois mil anos, seja tratada ao nível de merceeiro.

                      Em 1945, logo depois do final da guerra, Winston Churchill, que mobilizou a Europa e o mundo livre contra o nazismo, foi à Grécia para mostrar que a Europa livre apoiava a Grécia que resistia a ser encerrada na Cortina de Ferro de Estaline. Quando desembarcou, combatia-se uma guerra civil nas ruas de Atenas e ele nem conseguiu sair do aeroporto, porque nem sequer havia um poder estabelecido para o receber. Mas esteve lá, em nome da Europa e em nome da liberdade. Hoje, um qualquer finlandês ou polaco decide em Bruxelas sobre o futuro da Grécia, numa lógica de castigo e humilhação, e Bruxelas assiste, sem reagir, a que umas agências americanas, sem rosto nem qualificação para tal, decidam em seu nome se a Grécia deve ser reduzida a pó e Portugal a lixo. Para que a economia do planeta fique entregue ao combate final entre os especuladores financeiros da América e os piratas do dumping social asiático. Eis o que o capitalismo fez com a sua vitória histórica sobre o socialismo de Estado! (…)»

                        Atualidade, Opinião, Recortes

                        Doença crónica

                        leninismo

                        No debate sobre os caminhos mais próximos da «esquerda à esquerda» será bom reflectir sobre um aspecto, apenas aparentemente menor, que é mais fácil de abordar por quem fala do lado de fora de qualquer organização, sem compromissos com essa noção de unidade – ou de combate de tendências – que constrange sempre a liberdade crítica. O vício e a formação de historiador das ideias levam-me aqui a uma curta viagem até ao passado e a dois livros que cruzaram a história da esquerda, fundando um padrão de combate de ideias que me parece perverso e está na origem de parte considerável de alguns dos piores tiques e sintomas de doença crónica que atravessam a esquerda de matriz marxista. O primeiro foi a Crítica do Programa de Gotha, um dos mais importantes trabalhos de Marx, editado em 1891 mas escrito muito mais cedo, em 1875. O segundo foi A Revolução Proletária e o Renegado Kautsky, publicado em 1918 por Lenine. Um e outro tiveram como alvo a crítica de «oportunismos», ou «desvios», em ambos os casos tomados como formas inaceitáveis de pactuar com o capitalismo. Um e outro tiveram também como objectivo a defesa de uma «tirania das maiorias» consumada no rosto, mais vago e benévolo em Marx, mais cru e objectivo em Lenine, da «ditadura do proletariado». O que importa aqui não é, porém, debater o conteúdo de cada uma das obras, mas sim observar os termos em que foram escritas. (mais…)

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                          Já vi este filme (o caso Rui Tavares)

                          Rui Tavares

                          Aquilo que mais me preocupa no caso da demissão de Rui Tavares do lugar de deputado europeu independente pelo Bloco de Esquerda não é saber quem «tem razão». Ou quem cometeu mais ou menos erros. Ou se as coisas poderiam, por cada uma das partes, ter sido conduzidas de outra forma. Provavelmente poderiam. Como provavelmente todos deram passos em falso, embora aceitando que alguns desses passos em falso foram mais passos em falso do que outros.

                          Também não é coisa que me perturbe a evidente divergência das posições públicas do Rui Tavares em relação ao que parecia ser a linha oficial do partido. Aliás, foi justamente a sua condição de independente, foi o trabalho dele, e, em regra, foram as suas posições públicas muitas vezes autónomas, que aproximaram muitos eleitores do Bloco ou impediram outros de dele se afastarem. No que me diz respeito, foram pessoas como o Rui, o José Manuel, o Miguel, a Marisa, e tantas outras em quem confio, ou cujo trabalho aprecio mesmo quando não penso exactamente como elas, que, contra ventos e marés – para não atribuir nomes próprios a esses ventos e a tais marés – me fizeram votar uma outra vez, apesar de certas perplexidades, no BE.

                          O que de facto alarma, e muito, é ver a divergência política tratada com recurso ao processo – historicamente ancorado na tradição da esquerda velha, autoritária e rezingona – da calúnia, da insinuação, da ideia de «traição», da deturpação, avançados com uma violência desproporcionada em relação à que se utiliza para atacar os verdadeiros adversários políticos. E numa altura e que essa divergência deveria servir, justamente, para estimular o debate, que se torna imperativo travar, em torno das escolhas, dos métodos, e sobretudo da orientação política e dos objectivos, complementarmente dos rostos, de um Bloco de Esquerda capaz de recuperar do recente e significativo desaire.

                          Para quem já passou por isto noutros carnavais – pelo que ouviu, pelo que leu, e sobretudo pelo que viveu – há aqui uma sensação pesada de déjà vu. De voltar atrás no tempo, na história, regressando às mesmas injustiças personalizadas, aos mesmos exageros pautados por uma rígida agressividade, à mesma sensação de tempo perdido. Aquilo de que a esquerda, esta esquerda, precisa, não é de acusar, de diabolizar, de apontar hipotéticos traidores, de empurrar figurantes para fora do tablado, de alimentar uma qualquer caça às bruxas. É, justamente ao contrário, de ouvir, de confrontar, de discutir e de traçar caminhos partilhados, abertos, com base numa pluralidade que se faz das ideias e das escolhas mas também das pessoas.

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                            Luta pelo socialismo ou combate pela democracia?

                            BSS

                            Durante um entrevista concedida neste sábado, dia 18 de Junho, à Antena 1, Boaventura de Sousa Santos fez algumas considerações de um enorme interesse sobre os objectivos e reorganização da esquerda, justificando a maior atenção de quem, dentro deste campo, procure verdadeiramente uma maneira de sair do actual impasse que não seja a da habitual e suicidária fuga para a frente. Depois de afirmar que agora «a esquerda tem que se repensar muito», ou mesmo «completamente», Boaventura recorda que a «esquerda à esquerda», na qual engloba o Bloco e o PCP, foram construídos e conservam-se dentro de um imaginário fundado no princípio de acordo com o qual «a luta é uma luta anticapitalista», tendo o socialismo como horizonte único. Aceita, evidentemente, que este horizonte existe e continuará a existir durante muito tempo, «enquanto houver capitalismo», mas enfatiza que «neste momento a questão fundamental não é o capitalismo, é a democracia». Insistindo em que «o que está em causa é a sobrevivência da democracia». Daí que «das duas uma: ou esta esquerda quer participar na defesa desta democracia, ou não quer participar.». Precisa escolher. Boaventura entende também que o carácter imperativo de tal escolha se aplica a ambos os partidos, mas considera que aquele que está em condições de defrontar mais rapidamente este problema é o BE, uma vez que o Partido Comunista existe ainda, fundamentalmente, como força de protesto, enquanto o Bloco pode desenvolver-se na perspectiva de vir a participar «num arco de governabilidade» – obviamente assente em princípios – destinado em primeiro lugar a defender os valores essenciais, que são também sociais, do Estado democrático. A entrevista encontra-se aqui.

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                              O Bloco no seu labirinto (4)

                              Último post da série, um pouco mais comprido que os anteriores. Aspectos avulsos poderão ser desenvolvidos mais tarde. Recordo que escrevo estas notas a partir de fora, como simpatizante crítico, eleitor e «compagnon de route» do BE, do qual não sou militante. O meu objectivo é apenas estimular inquietações.

                              Anoto quatro possíveis áreas de intervenção no debate sobre a reorganização do Bloco e o seu papel na construção de uma alternativa à esquerda. Com a solidariedade social, o desenvolvimento económico e da qualidade de vida e a defesa da liberdade como elementos incontornáveis e comuns de um cenário com futuro.

                              1. No centro da necessária renovação encontra-se uma definição tão clara quanto possível do paradigma político a adoptar e uma identificação da base social que o pode apoiar. É preciso escolher de forma segura e consistente entre a construção de uma alternativa socialista e democrática, voltada para a produção de convergências no campo da governabilidade – uma «social-democracia de esquerda», sem dúvida, e não há que ter medo das palavras quando se nomeia esta tendência fundadora do movimento operário e popular –, ou a insistência num «comunismo modernizado», aparentemente arejado mas ao mesmo tempo nostálgico da intervenção redentora de uma vanguarda omnisciente e do papel de um Estado despótico. Escolher entre o protesto como uma necessidade, destinada a defender direitos e a melhorar a vida dos cidadãos, e o protesto como parte da «luta final», enquanto instrumento de uma transformação violenta da sociedade. É também preciso esclarecer o espectro sociológico que o Bloco está em condições de reunir. Com toda a probabilidade, a crescente mas empobrecida classe média urbana, os intelectuais e profissionais liberais desprezados pelo «desenvolvimentismo» capitalista, os estudantes e as mais novas e melhor formadas gerações de trabalhadores efectivos ou precários. Aceitando que outros partidos à esquerda, a começar pelo PCP, agregarão diferentes sectores. O «povo do Bloco» terá um rosto fundado nos interesses e expectativas sociais que podem convergir, mas sem a fantasia de um dia englobar toda a gente que confia na esquerda como território de um projecto solidário. (mais…)

                                Atualidade, Opinião

                                O Bloco no seu labirinto (3)

                                Terceiro texto da série sobre o presente e o futuro do Bloco de Esquerda. Depois do anterior, um tanto ácido no diagnóstico da situação, segue-se uma curta reflexão sobre a necessidade do debate. No quarto post identificar-se-ão alguns dos dilemas por onde este poderá passar.

                                Estando do lado de fora, só me chegam alguns ecos. Por isso não sei se a observação interna dos problemas com os quais se defronta agora o Bloco tem sido feita da melhor maneira. Mas existem sinais evidentes de crispação, traduzidos na rejeição liminar, por vezes pública, da posição de militantes e de simpatizantes que não se limitam a observar a espuma, a apontar pequenos erros de natureza táctica, pretendendo que se vá mais ao fundo dos problemas e que se debatam as escolhas centrais que parecem bloquear o partido. Não que estes sectores tenham necessariamente razão, ou razão em tudo, ou razão até ao fim, mas nem é isto que de momento está em causa. Preocupante, sim, é observar alguma resistência a um debate radical, isto é, que vá à raiz dos problemas e das escolhas, obviamente necessário e que nesta altura do calendário político se pode fazer sem riscos inultrapassáveis. Contrapondo-se uma reflexão que aparenta ser epidérmica, destinada a retocar a maquilhagem sem mexer nas rugas.

                                A verdade é que na esquerda, e na esquerda do Bloco também, parece permanecer ainda em algumas consciências um atávico «síndroma da linha justa», que insiste na dificuldade em questionar de cima a baixo as escolhas políticas fundamentais, aceitando que elas resultaram de logros ou de erros. Apesar dos múltiplos e dramáticos exemplos históricos dos desastres causados à mesma esquerda pela confusão entre certeza e convicção, continua a ocorrer, por vezes, uma dificuldade em rever posições, confundindo questionamento com maledicência ou traição, que deve bastante à escola de dogmatismo imposta pela matriz orgânica e moral leninista. Mesmo quando esta é formalmente renegada. Ao mesmo tempo, porém, são muitos os militantes insatisfeitos ou descontentes, e principalmente os simpatizantes e eleitores desconfiados, que conservam a esperança de – a partir de um debate aberto e sem complexos, pontualmente alargado até a não-militantes – ser possível diagnosticar os males, se necessário reformulando e reorganizando caminhos, e abrindo um futuro de esperança e de confiança para a imprescindível intervenção do Bloco nos tempos bem críticos em que vivemos. Mesmo que tal exija um ou outro safanão em algumas consciências e hábitos. [continua]

                                  Atualidade, Opinião

                                  O Bloco no seu labirinto (2)

                                  A caminho

                                  Prossigo com a série de posts sobre os dilemas que enfrenta o Bloco de Esquerda. Se o primeiro, sobre a demissão da liderança, terá sido quase consensual, este sê-lo-á bastante menos. Contém um esboço de diagnóstico ao qual se seguirão adiante algumas hipóteses de terapêutica. A parte mais difícil, onde se diz ao doente que está doente, segue aqui. Mas o que tem de ser…

                                  Os resultados eleitorais não deixam margem para dúvidas: algo correu mal. Mas ao contrário do que têm deixado entender certos dirigentes e militantes, com a capacidade crítica um pouco esmaecida pela decepção e a ressaca do day after, esse algo não foi com toda a certeza a ingratidão do eleitorado. Incluindo-se neste aquela parte da «geração à rasca» que com todas as probabilidades se absteve. É verdade que podemos, num ou noutro caso, falar com todo o sentido de um deslizamento dos números ditado pelo «voto útil» ou pelo medo. Mas a utilidade do voto não é um factor de importância menor e medo só pode ter quem enfrenta a escuridão sozinho e desarmado, não quem sabe para onde vai e avança acompanhado. A verdade é outra: o que aconteceu tem uma origem profunda, com toda a certeza bem menos conjuntural do que se está a tentar mostrar. Procurá-la e compreendê-la pode ser incómodo, obrigar a algumas mudanças, eventualmente a um ou outro abandono, mas não ao enfraquecimento do projecto político solidário e adaptado aos tempos difíceis em que vivemos que o Bloco de Esquerda tem materializado e pode manter.

                                  O problema central parece-me relativamente fácil de identificar: existiram duas escolhas que era preciso fazer mas que foram na direcção errada. A primeira diz respeito à identificação do BE com o que podemos considerar um «socialismo verdadeiro», assumindo uma componente democrática e intensamente solidária, mas voltada para a afirmação de programas materializáveis, ou então, no sentido oposto, com um «comunismo moderno», próprio dessa esquerda caviar – um epíteto lançado pela direita e rapidamente adoptado pela ortodoxia – que habita o sistema e dele recolhe alguns benefícios mas tem dificuldade em renunciar à nostalgia maximalista e revolucionária. Aos olhos do eleitorado reformista da classe média urbana, que representa o grosso dos eleitores do Bloco, a segunda opção tem vindo a surgir como dominante. E isto foi fatal. A segunda escolha ocorreu numa área completamente diferente e que parece (mas não é) contraditória em relação à primeira: o partido tem-se concentrado em excesso, tem-se esgotado, em termos públicos e organizativos, no trabalho parlamentar e nas agendas eleitorais, subvalorizando outros campos da vida colectiva e do combate social. (mais…)

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                                    O Bloco no seu labirinto (1)

                                    O Bloco no seu labirinto

                                    Este é o primeiro de um conjunto de curtos posts sobre o passado recente e o futuro do Bloco de Esquerda que publicarei ao longo dos próximos dias. Quero esclarecer que não sou seu militante, embora seja apoiante e votante, e seu crítico também, desde a primeira hora. E que estou suficientemente próximo para controlar a margem de erro do que escrevo.

                                    Quem veja a política, e em particular a política partidária, como uma experiência fundada no modelo unipessoal do líder que determina a linha, tem, visivelmente, uma grande dificuldade em dizer o quer que seja de razoável em relação à encruzilhada na qual se encontra neste momento o Bloco de Esquerda. O BE, convém lembrar, não funciona como o PS, o PSD ou o CDS, partidos nos quais a verdadeira força propulsora não é o programa ou a moção de orientação aprovada em congresso, mas sim a rédea e a retórica do líder e do seu pequeno grupo, que moldam a paisagem à sua volta para a adaptarem a uma intervenção carismática de tipo messiânico e a uma direcção centralizada. Foi este, aliás, um dos motivos que levou o Partido Socialista a um processo de descaracterização política que o fez perder a marca identitária de partido popular e de convicções. Mas o Bloco também não é o PCP, com uma direcção sedimentada, um corpo de funcionários profissionais e uma base social estável, que o autorizam a mudar alguns rostos e vozes sem com isso alterar significativamente a linha e o discurso. O Bloco é antes um partido de aproximações e de vontades, de convergências num ambiente de razoável liberdade, onde toda a gente fala com toda a gente, sem caciquismo instituído ou «centralismo democrático», que transforma cada militante, e mesmo cada dirigente, numa peça indispensável. Isto significa que pedir demissões a toque de caixa equivale a quebrar este clima razoavelmente aberto e democrático. E equivale também, dada a real escassez dos quadros, a propor a sua liquidação a médio prazo, eventualmente antecedida da tomada do poder por uma qualquer facção ultra-militante que o radicalize e faça sangrar até que retorne ao estado grupuscular de onde há mais de uma década partiu. [continua]

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