A norte do paralelo 38
Apesar do condicionamento endémico de stocks com o qual convivem hoje as nossas livrarias, não deve ser difícil encomendar alguma leitura sobre a República Democrática Popular da Coreia, a remota Coreia do Norte. Encontro três traduções mais ou menos recentes: Os Aquários de Pyongyang, de Kang Chol-Hwan (Hespéria), «Aqui é o Paraíso!», de Hyok Kang e Philippe Grangereau (Ulisseia), e A Longa Noite de um Povo, de Barbra Demick (Temas & Debates). Todas incorporam depoimentos de norte-coreanos que nos dão a ver o caráter absoluto, extremo, implacável, da experiência totalitária e da ditadura paranoide, supostamente comunista, que condicionam e subjugam o seu povo e o seu país.
Existe sempre um público para a exposição do horror e do sofrimento dos outros, mas tal não é necessariamente um sinal de perversão. Afinal, quem leia obras desta natureza não pode evitar uma relação de repulsa diante de tanto sofrimento e de tanto negrume. Mas a atração por esse tipo de testemunhos vem também do isolamento extremo do país e da dificuldade que todos sentimos de cada vez que procuramos obter informação credível, não contaminada pela fantasmagoria norte-coreana ou pela contra-propaganda. De facto, estas leituras ajudam-nos bastante a reduzir a distância, recolhendo experiências que, em regra, os noticiários, mais curtos e forçosamente truncados, acabam sempre por manter na sombra. (mais…)