
Em entrevista concedida ao Le Monde a propósito das eleições francesas, Jürgen Habermas considerou que a esquerda «deve deixar de ser um espaço para o ressentimento», sendo essa viragem que poderá torná-la «política e humanamente maioritária.» A palavra «ressentimento» toma aqui o seu sentido mais amplo, incorporando pesar, ofensa ou infortúnio. Tal ideia pode ligar-se a uma outra, proposta por Enzo Traverso a propósito daquilo a que chama «melancolia de esquerda». Esta traduziria uma imersão em projeções utópicas vinculadas ao passado, usando-as como alimento da dose de esperança de que precisa para continuar a viver.
Tanto o filósofo alemão como o historiador italiano são homens da esquerda e ambos abordam a dificuldade que esta tantas vezes sente em arquitetar futuros credíveis. Sobretudo futuros imediatos, que mobilizem para a ação e permitam sustentar projetos que não se frustrem logo no primeiro embate com a realidade, como aconteceu recentemente na Grécia com o Syriza. Na paisagem política portuguesa essa dificuldade pode associar-se à atitude geral dos dois partidos parlamentares que, sendo pedra essencial no atual equilíbrio de poder, mas não estando representados no governo, experimentam alguma dificuldade em articular este papel com a sua identidade política, com aquilo que deles espera o seu eleitorado mais fiel e com aquele que é o seu natural desejo de ampliar a influência política. ler mais deste artigo