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Anastasia

Anastácia

Tal como aconteceu com tantas outras pessoas do mundo inteiro, em criança fazia-me impressão a vida dramática da princesa Anastácia. Refiro-me a Anastasia Nikolaevna Romanova, a filha do czar Nicolau II que em 17 de Julho de 1918 teria supostamente sobrevivido ao massacre da família real russa levado a cabo pelos bolcheviques, seguindo depois uma vida errante e aventurosa, sempre à espera de um reconhecimento público que jamais chegou. A sua história foi desde cedo utilizada na propaganda anticomunista, tendo aparecido em livros, folhetos e histórias de banda desenhada, e servido também de argumento a canções. Uma delas, de Pat Boone, foi um êxito mundial nos idos de 50, e Sympathy for the Devil, dos Rolling Stones, faz-lhe referência («Anastasia screamed in vain»). Funcionou também como base do enredo de diversos filmes: o mais conhecido, com Ingrid Bergman, é de 1956, e o último, em técnica de desenho animado, foi estreado em 1997. Em Shadow Hearts: Covenant, um jogo para PlayStation 2, Anastácia aparece também como personagem. Pois bem, a Procuradoria-Geral da Federação Russa concluiu agora, após estudos especializados, poder «afirmar categoricamente» que os seus restos mortais estavam entre aqueles que, em 1991, foram recolhidos como sendo os dos abatidos em Iekaterinburgo. Mas como concluiu ao mesmo tempo que o Conselho dos Comissários do Povo e o Comité Executivo Central, na altura os principais organismos governamentais russos, não aprovaram a execução, fica sempre no ar uma suspeita de «limpeza da História» muito comum por aquelas paragens. Num certo imaginário romanesco, a imagem da princesa Anastásia continuará a pairar.

    Atualidade, História, Memória

    Salónica: uma cidade e o seu labirinto

    Salónica

    Versão revista de um texto publicado na LER No. 75

    Até 1909, o ano da fundação de Tel Aviv, Salónica era a única cidade do mundo na qual a principal língua utilizada era de matriz judaica. Por essa altura, a maioria da população falava ainda o ladino, ali estabelecido nos inícios do século XVI com a diáspora sefardita, mas viviam-se os últimos tempos de um espaço policromo, no qual cristãos, muçulmanos e judeus tinham podido conviver na diferença, apesar dos conflitos pontuais e das situações de desigualdade perante a lei otomana. É verdade que ela se parecia mais com uma justaposição de pequenas aldeias, nas quais turcos, judeus, gregos, búlgaros, albaneses, ocidentais e ciganos preservavam os seus territórios, mas nada de semelhante podia ser observado em qualquer outra grande cidade. Mark Mazower, especialista em história da Grécia e dos Balcãs, traça em Salónica – Cidade de Fantasmas o seu percurso único e fascinante, prestando uma particular atenção ao longo lapso de tempo que começou em 1430, com a tomada da cidade ao poderio bizantino-veneziano pelo sultão Murad II, e encerrou já em pleno século XX com a reinstalação, em território turco, dos últimos membros da comunidade muçulmana que nela haviam permanecido após a sua conquista pelos gregos. Durante todos esses anos, foi traçado um percurso sinuoso e complexo que Mazower descreve com uma profusão de informações capazes de trazerem à vida um passado do qual já quase não restam hoje vestígios materiais.

    O epíteto de «cidade dos fantasmas» diz essencialmente respeito ao total desaparecimento, ocorrido já no último século, de duas daquelas comunidades. O primeiro teve lugar imediatamente após o fim da dependência da cidade do estado turco, com a evacuação forçada da maior parte da população de origem muçulmana. O segundo, particularmente rápido e brutal, aconteceu em 1943, quando os ocupantes nazis enviaram para Auschwitz cerca de 50.000 salonicenses, dos quais apenas dez por cento viriam a sobreviver. Para além do enorme impacto humano no mapa da cidade, este facto ficou ainda associado à responsabilidade de numerosos cristãos gregos na repressão anti-semita que facilitou o trabalho dos ocupantes alemães. Alguns críticos consideram, aliás, que nesta obra o historiador menosprezou conscientemente a importância desse episódio vergonhoso da história contemporânea da Grécia.

    Salónica oferece uma leitura apaixonante, por intermédio da qual a evocação do passado, ali extremamente bem documentada e apresentada de forma consistente, confirma o trajecto único de uma cidade que não possuindo hoje o fascínio e o património monumental da rival Istambul, nem por isso deixa de simbolizar um reencontro que a história recente dos Balcãs tornou particularmente exemplar e perturbante.

    Mark Mazower, Salónica. Cidade de Fantasmas. Cristãos, Muçulmanos e Judeus de 1430 a 1950. Tradução de José Pinto Sá. Pedra da Lua, 576 págs. ISBN: 978-989-8142-10-8.

      Cidades, História, Memória

      Sud-Express

      Hendaya

      Fazer uma viagem, uma única viagem noctívaga e invernal, no Sud-Express, foi experiência rara, agarrada para sempre à pele e à memória. Esqueci os rostos, esqueci, mas rememoro os olhares dos velhos de trinta anos que olhavam tristes sob uma luz amarela e baça e fotografias coloridas à mão do Palace-Hotel do Buçaco. E, mais ainda que esses olhares, aquele cheiro doce e ácido, ao mofo profundo das cestas de vime, da cerveja choca derramada, das sandes de chouriço vermelho embrulhadas pelas mães, da roupa de domingo suja e amarfanhada, dos pés suados em peúgas tricolores. «Preconceito de classe», diria Victor. «Um quadro neo-realista» ensaiaria José. Com a marca profunda do que era, no pequeno país là-bas, a miséria mais indeclinável e verdadeira.

        Memória, Olhares

        A FNAC não tem cheiro

        O Leitor

        Bem sei que a imagem está corroída até à carcaça, mas a vida nunca é feita de experiências únicas. Sempre tive uma espécie de fixação lasciva no papel impresso. Mantinha estimulantes experiências olfactivas quando na camioneta das seis da tarde chegavam à loja, atados com um cordel de sisal e de rótulo fixado com uma cola escura, feita à mão, os rolos de jornais impressos em Lisboa na madrugada anterior. Outra, mais preciosa, encontrava-a nos fundos de uma casa de ferragens que vendia também artigos de papelaria, quando lá ia dar cabo das economias da semana em revistas de quadradinhos e carteiras de cromos. Logo que comecei a frequentar livrarias e bibliotecas que não conheciam ainda o vício da limpeza a aspirador de alta voltagem e a modernice da desinfestação química, passou a dar-me um prazer particular sentir aquele cheiro único a folhas novas e usadas, cobertas de imagens e sinais, capas coladas ou cosidas, mapas e cadernos, dedadas das pessoas, aparas de lápis e marcas de insectos. Elas transformaram-se então em alcovas peculiares, lugares para a consumação do vício solitário da leitura, da contemplação orgástica das pilhas dos livros, da apalpação das lombadas. Ainda me entrego silenciosamente a tais práticas, admito, em certos alfarrabistas, em velhas livrarias de província, e noutras, raras, que vou encontrando fora de portas. Existe por isso qualquer coisa de estranho, de enfadonho, insípido e incolor, nas estantes dos hipermercados de livros: elas já não têm sovacos, não cheiram, e, por isso, não dão gozo. Vício antigo e que vai desaparecer, o papel impresso é como aquelas meias de vidro com forte percentagem de fibra e costura na parte de trás, que fazem um ruído peculiar quando roçagam uma na outra: estão fora de moda mas não deixam de abrasar. Ou estarão de novo na moda e eu, demasiado concentrado na leitura, ainda não dei por isso.

          Devaneios, Memória

          Relógios cubanos

          São poucas, seis ou sete, ou nem isso, as pessoas com as quais, ao longo da vida, verdadeiramente me incompatibilizei. Embora, quando já nada poderia fazer para voltar atrás, tenha concluído que em relação a duas ou três delas talvez fosse desejável que isso não tivesse acontecido. E que teria sido bom se essas pessoas pudessem ter sido trocadas por outras com quem tive forçosamente de conviver, embora a grande contragosto. Curioso é que alguns desses casos pessoais de desavença levada até à rutura se ficaram a dever a uma mesma razão, talvez incompreensível para quem considere apenas acessória a prática política: a posição de rejeição do regime cubano que a partir de certa altura, e apesar de respeitar a mensagem de esperança e utopia que um dia ele oferecera, comecei a manifestar. Não me zanguei com esses ex-amigos – ou eles não se zangaram comigo – por algum de nós ter chamado um nome feio ao outro. Zangámo-nos, na época, por causa de Fidel.

          Aquilo que pode parece estranho a alguns, explica-se, no entanto, com uma relativa facilidade. Junto de uma grande parte das pessoas de quem fui ou sou próximo, pessoal ou politicamente próximo, a imagem do regime cubano, da sua realidade presente, e sobretudo do seu passado, permanecem ainda intocáveis. Mesmo junto daquelas que se viram desiludidas ou ficaram elucidadas com as experiências brutais do estalinismo e os trajetos falhados das últimas décadas do «socialismo real», Cuba permaneceu como o último dos santuários, associado a uma espécie de bem imanente que não deve nem pode ter um fim histórico e dar lugar a outra possibilidade. Ligada a uma experiência única, venerável mesmo quando se percebe, e há provas disso, que já não mobiliza e muito menos assombra.

          Para compreendê-lo recuo no tempo que moldou a memória que partilhei, e ainda partilho, com essas pessoas. Quando os barbudos da Sierra Maestra tomaram o poder em Havana, já era vivo. Sabia ler, ou soletrar, o jornal que o meu avô me punha à frente todos os dias, e julgo que por causa desses momentos parte das minhas mais recônditas recordações políticas semligam à imagem daqueles homens e mulheres de porte jovem e desobediente, sublimes e diferentes para quem vivia num universo cor de cinza, ordeiro e aparentemente imutável. Anos depois, fui percebendo que aquelas imagens tinham participado de uma forma poderosa no modo como a minha personalidade foi sendo estruturada. Sei que algo de semelhante aconteceu com muita gente, mais ou menos da minha geração ou um pedaço mais velha, e um pouco por toda a parte: em Portugal, por toda a Europa, na América Latina ou até nos Estados Unidos. Falei disso com algumas, e ainda o faço de vez em quando, e li também alguma coisa sobre o assunto, como Cuba: Island of Dreams, um livro de Antoni Kapcia publicado em 2000, ou um óptimo estudo de Kepa Artaraz (de quem saiu, na Palgrave, Cuba and Western Intellectuals Since 1959).

          Percebo, pois, que para muitos dos que vivem da fidelidade às causas e às convicções que os compuseram, e que pelas circunstâncias da vida não foram desenvolvendo uma capacidade de adaptação à novidade – o que não é necessariamente mau ou bom – reconhecer o falhanço e a desonra do caminho tomado pela Cuba «revolucionária» é qualquer coisa que custa a engolir. Mesmo quando se aceita que a condição de gratuitidade da saúde é importante, que a educação, apesar de não livre, é para todos – também o eram a saúde e a educação dirigida na generalidade dos países do leste europeu até à Queda do Muro de Berlim -, percebe-se, pois quem visite a ilha com os ouvidos abertos sabe que tal não chega para um número crescente de cubanos, que isso não basta para continuar a apontar Cuba como modelo. Ainda que possa bastar para uns quantos prosélitos continuarem a elogiar a caduca fortaleza que consideram um Eldorado e um modelo a seguir.

          Custa sempre, de facto, descartar as marcas que pautaram os ideais de juventude, ou que nortearam toda uma vida, e foi isso que os tais dois ou três meus ex-amigos revelaram. Penso neles, nesses companheiros que perdi, furiosos com as minhas críticas à rigidez do regime de Havana, à repressão que instituiu, à violência que continua a exercer, após vai para seis décadas de vida, sobre os cidadãos que pensam por conta própria, nesta noite na qual se perfazem os 50 anos sobre a queda do ditador Batista e a bela vitória da revolução dos mal-fardados de verde-oliva. E tenho pena de que tenham parado os seus relógios algures num tempo que não volta. Num passado no qual, todavia, precisam dramaticamente confiar para continuarem a olhar-se ao espelho como gostam de se ver.

            Atualidade, História, Memória, Olhares

            Alexandre, o «Maior»

            Alexandre Nevsky

            Originalmente em Caminhos da Memória

            O concurso sobre «o maior russo de sempre», organizado pela televisão estatal da Rússia, revela alguns pormenores nos quais vale a pena reparar. As personalidades mais votadas foram, em primeiro, Alexandre Nevsky (o príncipe de Novgorod que no século XIII dirigiu a resistência dos russos diante dos cavaleiros teutónicos, conseguindo conservar o predomínio da fé ortodoxa, teve 11,7% dos votos), em segundo Piotr Stolipin (primeiro-ministro da Rússia a partir de 1906, assassinado em 1911, responsável por reformas económicas que procuraram estimular o mercado rural e pelo acentuar da repressão sobre as forças políticas anti-czaristas, juntou 11,6% dos votantes), e em terceiro lugar, com 11,5%, José Estaline, que dispensa apresentações (e serviu de modelo ao Alexandre Nevsky filmado por Eisenstein). Lenine ficou-se pelo sexto lugar, logo após o poeta Pushkin e o czar Pedro I, o Grande, e antes mesmo de Dostoievski e do generalíssimo Suvorov. A primeira mulher a aparecer na lista – ou melhor, a única referendável – é, como seria de esperar, Catarina, a Grande.

            Tal como já aqui escrevi quando do concurso que considerou António de Oliveira Salazar «o maior português de sempre», este tipo de certame é irrelevante enquanto «sondagem de opinião» e, a ter acontecido na Rússia algo de semelhante ao que ocorreu em Portugal – o que, admito, não posso agora provar -, a «eleição» poderá ter sido condicionada por um certo número de activistas que se desdobraram em iniciativas de apoio às diversas personalidades, perante uma larga maioria de cidadãos que olhava o episódio como mero divertimento. Não deixa, porém, de ser um sintoma sobre a existência de um caldo de cultura no qual a autoridade discricionária do Estado e o nacionalismo mais agressivo emergem com factores positivos, indicadores de uma «grandeza» que se acredita perdida mas regenerável (Medvedev e Putin não foram concorrentes, vale a pena lembrar). O episódio não terá a dimensão que os meios de comunicação, sempre desejosos de estrondo, sugerem, mas não deixa de ser um factor presente no terreno. Lá como cá, sempre um pouco preocupante.

              Atualidade, Cinema, História, Memória

              Feliz Natal, por acaso

              Natal 2008

              Independentemente da cantiga de Paulo de Carvalho e das delicadas questões de género que a frase evoca, durante algum tempo achei mesmo que «natal é quando um homem quiser». Em criança porque todos os dias eram um dia bom para receber uma prenda e olhar o céu, fazendo muita força para que acontecesse qualquer coisa de extraordinário. Anos depois, decepcionado já por nada acontecer e cometa algum cruzar o firmamento a anunciar o nascimento de um bebé chorão, a frase serviu de álibi para cumprir rapidamente os deveres familiares e partir a passar a noite com gente que queria transformar a festa cristã numa big party da fraternidade universal, com os trabalhadores do mundo inteiro unidos em torno de um imenso peru.

              A partir de dada altura a data transformou-se, porém, num fardo, num tempo de deveres, e, sobretudo, numa fase do ano, acompanhada de chocalhos e campainhas, na qual se tornou socialmente difícil, sob pena de ser notado como excêntrico, exibir no rosto um sinal de contrariedade. O Natal, agora maiúsculo, deveria ser tempo de alegria obrigatória, no qual todos deveríamos esquecer a luta entre as forças do bem e as forças do mal, e embarcar eufóricos, cantando um Jingle Bells em todas as línguas, no trenó do senhor das barbas.

              Compreendi finalmente que o Natal é quando os outros querem que seja, e não quando cada um de nós o deseja. E foi então que me começaram a pesar os cartões institucionais, empresarias ou pessoais – hoje quase sempre mensagens de e-mail ou ésse-éme-ésses remetidos a um undisclosed recipient – desejando uma «Feliz Natividade», uma «Óptima consoada», um «Santo», «Próspero», «Bom Natal». Claro que comemoro a data, troco prendas, desejo aos outros (e espero para mim, e agradeço aos amigos que me recordam nesta altura) festas muito felizes. Mas não é por ser o 25 de Dezembro. É porque calha todos termos esta noite um pouco mais livre que as outras.

                Apontamentos, Memória, Olhares

                Visão cubana

                Cubana

                O último número da Visão/História tem como tema «Cuba – 50 anos de Revolução». Trata-se de um conjunto de artigos, testemunhos e cronografias que conduzirá alguns leitores a uma revisitação da memória da tomada do poder pelos rebeldes da Sierra Maestra e dos anos inaugurais da sua experiência de poder. Para a maioria deles, porém, não produzirá esse efeito: servirá sobretudo de utensílio para se entender um pouco melhor uma das experiências colectivas mais importantes, controversas e perenes do último meio século.

                A revista tem algumas falhas, evidentemente. Desde logo a inexistência de um texto apologético do regime. E não seria difícil encontrar quem o escrevesse de boa vontade. Dado o magnetismo que a experiência cubana ainda conserva, ele deixaria perceber/ler uma perspectiva mais fideísta. Já o artigo sobre o Che é um tanto insípido, quase omitindo o seu lado autoritário, a importante dimensão carismática e o ascetismo insubmisso dos últimos tempos. E ficam por tratar as suas crescentes divergências com Fidel, que o regime de Havana faz por apagar. No entanto, em parte foram elas que levaram Ernesto Guevara a deixar Cuba a caminho do seu mandato internacionalista. O testemunho do ex-embaixador Alfredo Duarte Costa – lamentável no modo como enfatiza o trato cortês de El Comandante, que conheceu em privado, como sinal de que as críticas de que este tem sido alvo «pouco ou nada têm a ver com a realidade» –, nega até essa incompatibilização, dando como prova a sua carta formal de despedida e o testemunho-mantra da «viúva oficial». Para se perceberem melhor os limites desta «argumentação», bastará a leitura da biografia do Che escrita por Pierre Kalfon. Negativo é ainda o facto da repressão sistemática sobre a dissidência interna ser mencionada de forma demasiado suave.

                Estes reparos não são suficientes para anular o interesse da publicação. Para além de um reconhecimento útil de dilemas actuais, nela se ouve ainda, em diversos momentos, o eco da enorme e quase consensual simpatia com a qual, nos inícios da década de 1960, uma grande parte de elite intelectual e da juventude portuguesa da classe média olhava a revolução, empolgante e única, protagonizada pelos barbudos. No testemunho que prestou à revista, Nuno Teotónio Pereira evoca o modo como correram as coisas em 1963, no Congresso da União Internacional dos Arquitectos que teve lugar em Havana e ao qual assistiu. Não escondendo o entusiasmo que então se sentia no ar e que partilhou, recorda: «Regressei a Portugal sem fazer a barba. Até hoje.»

                  Atualidade, História, Memória

                  Por acaso

                  O fim do Pacto
                  «Revolucionários profissionais» segundo o Que Fazer? (1902), de V. I. Lenine: Gustav Husák (76 anos, ex-desempregado, funcionário do Partido Comunista da Checoslováquia), Todor Jivkov (78 anos, operário tipógrafo, funcionário do Partido Comunista Búlgaro), Erich Honecker (77 anos, operário da construção civil, funcionário do Partido Comunista Alemão), Mikhail Gorbachev (58 anos, licenciado em economia, funcionário do Partido Comunista da União Soviética), Nicolae Ceausescu (71 anos, operário sapateiro, funcionário do Partido Comunista Romeno), Wojciech Jaruzelski (66 anos, camponês, militar, funcionário do Partido Comunista Polaco) e Janos Kádár (77 anos, operário tipógrafo, funcionário do Partido Comunista Húngaro).

                  Existem acasos curiosos. Lia no Expresso um artigo de José Pedro Castanheira sobre a eleição do novo Comité Central do Partido Comunista Português e a sua composição. Ali se referia que, dos seus actuais 158 membros, 100 são funcionários do partido, 6 são funcionários da JCP, e, dos restantes, a maioria tem ocupações como sindicalista a tempo inteiro, deputado ou autarca, mas antes de o serem foram também funcionários do PCP. Pouco depois, ao procurar uma matéria na Internet, dei de caras com a fotografia acima reproduzida, tirada em Bucareste a 7 de Julho de 1989, cerca de quatro meses antes da Queda do Muro de Berlim, durante a derradeira reunião dos chefes dos partidos e dos estados do Pacto de Varsóvia após a qual se tornaram irreversíveis «a destruição da URSS e as derrotas do socialismo no Leste da Europa» (in Teses do XVIII Congresso). E não pude deixar de reparar na composição social do grupo. Só o leitor poderá dizer se faz ou não algum sentido esboçar uma analogia entre os dois momentos.

                  Adenda –  Não, não se trata de desvalorizar a inevitabilidade de funcionários desta natureza. Em democracia ou em ditadura, eles existem para cumprir profisionalmente determinadas tarefas. Mas sim de chamar a atenção para o estilo de «ligação à vida», comendo e respirando sempre o mesmo ar, que desenvolvem pessoas com vinte, trinta, cinquenta anos de casa como funcionários partidários ou sindicais. E o que isso provoca em partidos ou sindicatos nos quais a maioria esmagadora dos dirigentes se encontra nessa situação. Os da fotografia acabaram como se sabe.

                    Atualidade, História, Memória

                    Três notas sobre o Primeiro de Dezembro

                    Luanda - Restauradores

                    1. A maioria dos portugueses desconhece hoje a origem do feriado que, entre o passeio pelo maior centro comercial das imediações e uma multicultural caipirinha bebida à lareira, passa em família ou com os amigos, fazendo de contas que abre um pequeno parêntesis na crise. No entanto, a restauração do reino de Portugal em relação à «Coroa de Espanha», na qual se encontrava integrado desde o final trágico da aventura marroquina de D. Sebastião, e a Guerra da Aclamação que se lhe seguiu, representaram um ponto de viragem fulcral na definição da identidade política e cultural dessa pátria da qual se ouve ainda, nos estádios de futebol e nos desfiles militares, «a voz dos seus egrégios avós».

                    No dia 1 de Dezembro de 1640, porém, não ocorreu revolução alguma, como falseou durante décadas a historiografia salazarista. O que aconteceu não passou, de início, de um rápido putsch militar local contra a política centralista do Conde-Duque de Olivares: prendeu-se a vice-rainha Margarida de Sabóia, passou-se pelas armas o odiado Miguel de Vasconcelos e aclamou-se rei o duque de Bragança, enquanto a maior parte da nobreza e do alto clero se mantinha fiel a Madrid. Já decisivas foram depois as campanhas militares, prolongadas em diferentes fases, em território ibérico, entre 1640 e 1668, e alargadas ao combate pela manutenção do Império, principalmente no Brasil, em Angola e na Índia. Vinte e oito anos de guerra dura e custosa, no correr dos quais se foram autonomizando e desvinculando da influência espanhola – definindo-se, como nunca antes ocorrera, uma forte identidade antimadrilena -, a prática política, a actividade diplomática, a língua portuguesa, a literatura nacional, a organização militar, o discurso historiográfico e até a oratória sagrada.

                    2. Foi no cinema Restauração, em Luanda, que vi O Último Tango em Paris. A democracia tinha meses, e brancos, pretos e mulatos, homens e mulheres, velhos e crianças, acotovelavam-se em filas enormes por um bilhete para a «cena da manteiga» do primeiro «filme pornográfico» legalmente exibido. Corria o ano de 1975 e, ao que me disseram, era então novidade o encontro no foyer de pessoas cujo tom de pele, um ano antes, lhes teria interditado aquele espaço. O cinema Restauração hoje já não é cinema e mudou de nome. Chama-se Casa das Leis e tem servido de sede à Assembleia Nacional angolana. Mas todos os angolanos europeus que por lá passaram continuam a usar a denominação colonial. Eu próprio, anticolonialista que por sê-lo passei por duas «custódias», é assim que o recordo.

                    É difícil mudar os mapas que nos mostraram durante anos, por isso, para muitos, é difícil designar as cidades angolanas pelo nome legítimo actual. Luanda e Benguela continuam a ser Luanda e Benguela, e quase todas as pessoas sabem que o Huambo foi em tempos Nova Lisboa. Mas que dizer do Soyo, de Luena, de Saurimo, de Lubango, de Tombwa? Para muitos, não necessariamente obstinados colonialistas ou seus ressabiados descendentes, são ainda Santo António do Zaire, Luso, Henrique de Carvalho, Sá da Bandeira e Porto Alexandre. E, voltando ao início, como se chamará hoje a antiga Avenida dos Restauradores de Angola? Tenho a resposta: chama-se Rua do Congresso do MPLA, apesar de na rua toda a gente lhe chamar… Avenida dos Restauradores. Podem, todavia, encontrar-se sinais contraditórios: dizem-me que a Rua Karl Marx passou há algum tempo a Avenida de Portugal, o que sempre será indício de uma reconciliadora esperança de sabor pós-colonial.

                    3. O momento de mais um aniversário da Restauração da Independência serviu também para que pudesse começar a compreender um pouco melhor a política de alianças do PCP. Tendo em vista aquele que, presumo, possa ainda ser o seu interesse pela partilha de responsabilidades de poder. Após os ataques, durante este XVIII Congresso, à dimensão «social-democratizante» (sic) do Bloco de Esquerda e aos propósitos dos chamados «alegristas», marcados como uma espécie de quinta coluna destinada a desviar da linha justa o eleitorado que considerem ser naturalmente «seu», fiquei a ruminar sobre que espécie de forças imaginará o PCP poder ter como aliadas no combate – julgo que não meramente protestativo ou limitado à repetida «táctica da trincheira» -, por uma alternativa de governo. Para além, claro, da anuência instintiva dos organismos-criatura, um tanto ridículos e sem qualquer representatividade, como os chamados «Verdes» ou a Intervenção não-sei-o-quê (peço desculpa mas não consigo recordar agora o nome). Julgo ter resolvido a dúvida lendo hoje, no caderno P2, as palavras de simpatia do «senhor dom» Duarte de Bragança, descendente reconhecido do monarca restaurador e o nosso actual «reizinho», pelo carácter eminentemente patriótico do Partido Comunista Português.

                      Atualidade, História, Memória

                      Aquela tatuagem no braço

                      Tatuagem

                      Versão de um texto publicado originalmente na revista LER

                      Pouco se tem escrito sobre aqueles cujos pais sobreviveram aos campos nazis de extermínio. As consequências pesadamente traumáticas para os próprios deportados são hoje bem conhecidas, mas a presença do seu eco junto dos descendentes mais directos tem permanecido silenciada. Este livro destaca treze testemunhos de filhos de judeus franceses sobreviventes de Auschwitz, todos eles nascidos pelos finais da década de 1940, que desafiados pela autora, a jornalista Nadine Vasseur, aceitaram comentar uma condição que os acompanhou a vida inteira mas da qual jamais haviam ousado falar publicamente.

                      Todos coincidem num aparente paradoxo: se, por um lado, a experiência-limite da deportação e da vida nos campos é intransmissível, dada a impossibilidade real de quem a recebe poder conceber sequer o sofrimento extremo e solitário dos que a conheceram directamente, por outro ela criou nestes uma capacidade de sobrevivência, e de resistência perante a adversidade, que os colocou acima daquelas exibidas pela maioria esmagadora dos humanos, tornando-os pessoas tão admiráveis quanto, obrigatoriamente, «difíceis» no trato diário. Esta dificuldade encontra-se patente em atitudes que jamais deixaram de perturbar aqueles que, na sua condição de filhos, com elas sempre tiveram de conviver: a descrença («ajuda-te a ti próprio, o céu não te ajudará»), a secura («podem ficar com o olhar húmido, mas não choram»), o silêncio («meteu a sua história dentro de uma caixa e pôs uma tampa»), mas também, e talvez acima de tudo, uma imensa capacidade para enaltecer «o imenso valor da vida», traduzida geralmente na pouca vontade de repisar um passado que preferiam manter no seu foro íntimo. Para além, naturalmente, do convívio com as sequelas de uma condição pós-traumática que os impelia a calarem-se.

                      Este volume mostra como foram afinal os seus filhos a transportarem parte substancial do fardo. Todavia, este processo de transmissão do trauma da Shoah não é aqui abordado a partir de uma perspectiva psicanalítica: a autora raramente suscita reminiscências, a não ser aquelas que qualquer pessoa colocaria perante narrativas tão extraordinárias como as que foi ouvindo durante o seu trabalho de recolha. Pelo contrário, vai dialogando com a singularidade de cada testemunho, com o seu carácter sempre perturbante, com a dificuldade sentida por cada um em falar de pormenores simples apenas na aparência, como a forte lembrança dos gritos dos pais em noites de pesadelo ou a visão «daquela tatuagem no braço, que sempre conheci».

                      Uma obra comovente, que contorna a actual «indústria do testemunho» sem desvalorizar a importância crucial da história oral para o esclarecimento do mundo contemporâneo. E que abre um novo caminho a todos quantos se importam com a salvaguarda da memória do totalitarismo nazi, com a luta contra a revisão negacionista da sua dimensão anti-humana e com o prolongamento conflitual do seu impacto no presente.

                      Nadine Vasseur, Eu Não Lhe Disse Que Estava a Escrever este Livro. Filhos de Sobreviventes do Holocausto Testemunham. Tradução de Lúcia Liba Mucznik. Pedra da Lua, 160 págs. ISBN: 978-989-8142-09-2

                        História, Memória

                        Antonio e Teresinha

                        Gramsci

                        Os responsáveis pela gestão da Igreja Católica Apostólica Romana têm a memória curta. Ou então mentem muito, violando farisaicamente o 8º mandamento. Pois de que outra forma se explica que só ao fim de 71 anos se tenham lembrado de vir dizer – sem prova alguma para além do carácter «distinto» de quem o diz – que Antonio Gramsci se converteu em devoto de Santa Teresinha do Menino Jesus no leito de morte? Para mim, ex-aprendiz de intelectual orgânico, se a generalidade dos leninistas nossos contemporâneos não fosse semi-iletrada e tivesse lido com um pouco de atenção os Quaderni del Carcere escritos pelo fundador  e antigo secretário-geral do PCI, que enfrentou Estaline e morreu com a saúde arruinada pelos fascistas, diria que se tratava de uma provocação anticomunista, digna dos melhores tempos da Guerra Fria. Nas actuais condições, parece-me apenas oportunismo beato emanado da sempre lúgubre e inesgotável caverna vaticana. Embora, como todos sabemos, no leito de morte já não respondamos por nós.

                          Atualidade, Memória

                          Os nossos maos

                          Maos

                          Um excelente texto-síntese sobre a história do maoísmo em Portugal – autodesignado «marxismo-leninismo» num tempo em que a categoria não tinha ainda sido recuperada pelo PCP com a veemência com que o faz agora – é aquele que Miguel Cardina publica nos Caminhos da Memória. Como parte interessada – enquanto actor, testemunha e historiador – só posso mesmo recomendá-lo.

                            História, Memória

                            Sidney

                            Sidney Poitier

                            Um post mais do que oportuno do Corta-Fitas evoca o actor Sidney Poitier, o americano «de cor» que abriu atalhos ainda improváveis na década de 1950. Lembra Pedro Correia: «Antes dele, os negros em Hollywood apenas podiam ser mordomos, porteiros de hotel ou pianistas de bar. Depois dele, puderam ser tudo.» A minha memória ainda consegue reproduzir o efeito de sopro que se sentiu em Portugal quando da estreia diferida de Guess Who’s Coming to Dinner / Adivinha quem vem jantar, de Stanley Kramer. O filme é de 1967, mas foi preciso esperar pela balbúrdia marcelista para ele poder correr nas salas de cinema portuguesas. Ver Sidney fazer de Dr. Prentice, o noivo de Joey, uma jovem WASP com uns pais conservadores que rejeitavam o seu amor – e ver um negro e uma branca beijando-se no grande ecrã –, foi na época, para muitos, quase um acto de militância antiracista e anticolonialista. Hoje quase não dá para acreditar, pois não?

                              Cinema, Memória

                              Um Z contemporâneo

                              Zorro

                              Adaptação de um artigo publicado em 2006 na revista Penetrarte

                              Em A Máscara de Zorro (1998), o filme de Martin Campbell anterior à sequela A Lenda do Zorro, o herói na pré-reforma (Anthony Hopkins) passava o testemunho ao jovem bandoleiro (António Banderas). Entretanto saiu Zorro – O Começo da Lenda, o romance de Isabel Allende no qual se forja a educação e a sina da velha figura de capa, espada e mascarilha. Na página inicial, uma frase curta – «Existem muito poucos heróis de coração romântico e de sangue leviano. Digamo-lo sem rodeios: não há nenhum como o Zorro» – arrasta o leitor para um universo de mistério e intriga que a chilena reinventa, reconduzindo o personagem às suas origens e avançando um passo mais na sua renovação.

                              O nascimento do Zorro conta-se em poucas linhas. Quando o galante Douglas Fairbanks casou com a diva Mary Pickford e os dois seguiram em wedding-trip para a Europa – uma espécie de viagem de núpcias para americanos ricos – durante a travessia do Atlântico, Fairbanks, entediado com a monotonia do horizonte, entreteve-se a ler The Course of Capistrano, uma espécie de folhetim publicado em 1919 na All-Story Weekly pelo autor de novelas e de argumentos Johnston McCulley. Por sua vez, este havia-se inspirado em Life and Adventures of Joaquin Murieta: The Celebrated California Bandit (1854), uma obra de pulp fiction do escritor índio John Rollin Ridge (também lembrado por alguns como Yellow Bird). A trama do livro interessou Fairbanks a tal ponto que, de regresso a Hollywood, produziu e protagonizou de imediato a película A Marca do Zorro (1920). Inspirado na figura recriada por McCulley, deu-lhe no entanto um toque pessoal, compondo alguns dos seus traços físicos e inventando o sinal «Z», desenhado, como toda a gente sabe, com três estocadas rápidas e destras de florete. As legendas iniciais – «Na Califórnia, há cerca de cem anos, apareceu um cavaleiro mascarado, protector do povo e carrasco dos seus sanguinários opressores» – fundaram o mito contemporâneo, construído ao longo dos anos através de variantes conotadas com um sentido justiceiro comum. De facto, mesmo nas versões mais inócuas das andanças do Zorro e dos seus sucedâneos – como os que aparecem na série de televisão produzida entre 1957 e 1959 pela Disney, na banda desenhada do Lone Ranger (com o seu companheiro de nome Tonto), semi-plagiada na década de 1930 por Striker e Arbo (adaptada no Brasil e em Portugal como Zorro), ou ainda no talhe essencial da figura redentora de Batman, de Bob Kane – reconhece-se como central a função reparadora daquilo que carece de ser reparado, mesmo quando esta acção é colocada ao serviço de uma ordem dominante que jamais é posta em causa.

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                                Memória, Olhares

                                Uma lição de João (adenda)

                                João Martins Pereira

                                Originalmente em Caminhos da Memória

                                O texto que escrevi ontem sobre o desaparecimento de João Martins Pereira não era uma evocação nem pretendia servir de obituário. Correspondeu apenas a uma reacção a quente perante a notícia da morte de uma pessoa que não conheci pessoalmente mas me habituei a acompanhar. Na minha biblioteca, em lugar acessível, os seus livros estão encostados aos de António José Saraiva e de Eduardo Lourenço, e julgo que tal poderá dizer alguma coisa a alguém. Ou di-lo a mim, pelo menos. Não falei portanto de algumas das suas intervenções e das ausências me falaram mails que recebi entre ontem e hoje. Não lembrei, por exemplo, a sua proximidade dos processos de fundação do MES e, muitos anos mais tarde, do Bloco de Esquerda. Ou a sua actividade como professor, engenheiro e cronista.

                                Mas uma ausência me parece de facto injusta. Num testemunho conciso e comovente saído hoje no Público, Eduarda Dionísio anota o esquecimento de um jornal absolutamente único, publicado a partir de 1975, do qual João Martins Pereira foi director, colaborador e acima de tudo grande entusiasta. Tratava-se da Gazeta da Semana, anos depois reduzida por dificuldades várias a Gazeta do Mês, e do qual até tinha a colecção completa, desaparecida algures junto com um caixote que levou descaminho numa qualquer mudança. Sobraram-me apenas alguns exemplares dispersos, e é de um deles que me sirvo para ajudar a preencher a falha.

                                Junho de 1980, artigo «Resistir ou Re-existir» na Gazeta do Mês número 2: «A condição feminina é-me exterior, como o é, num outro plano, a condição operária, a mim, intelectual de extracção burguesa. Libertar-me do complexo de “não ser operário” não é distanciar-me do problema da exploração. É justamente escolher colocar-me, em relação a ele, na única posição que, de boa-fé, me é possível assumir: a da apreensão intelectual, a da “teoria”, a de uma prática solidária, que não a de uma prática vivida (impossível) ou a de uma prática imitada (falsa). Levantemos de uma vez certas ambiguidades persistentes: não posso fazer minha a luta pela emancipação feminina, como não posso fazer minha a luta proletária. Estou com elas. E ao estar com elas, isso determina-me nas lutas que me pertence, a mim, travar.» Parágrafos destes, num tempo dominado agora pelos exageros do politicamente correcto e pelo receio da exposição pública, não existem muitos.

                                [Entretanto o Centro de Documentação 25 de Abril disponibilizou online a colecção da Gazeta da Semana]

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