Pedir perdão servirá de alguma coisa? Rebobinar o filme da história e reconhecer que os do nosso sangue erraram, ou agiram de uma forma medonha, só aos ignorantes e aos hipócritas pacificará as consciências. As crianças aborígenes das «gerações roubadas» jamais reaverão a infância que a natureza lhes havia destinado. Mas pede-se-lhes desculpa e pronto. E ponto. Como se pediu já, vezes sem conta, aos descendentes dos índios americanos contagiados e massacrados, dos judeus errantes reduzidos a cinzas ao longo de séculos, dos escravos que sobreviveram à medonha viagem transatlântica. Um dia pedi-la-emos também aos netos dos africanos que não morreram exaustos junto às margens das praias peninsulares. E, tolhidos pelo arrependimento, continuaremos distraídos perante o trabalho macabro que nunca pára. Lá longe, entre remotas gentes ou fora da nossa vista.
A leste do faroeste
Uma certeza podemos ter se, tal como se espera, os democratas ganharem desta vez a Casa Branca: desaparecerão dos nossos visores aquelas imagens regulares, invariavelmente grotescas, de um cow-boy, de botas texanas com apliques e pernas levemente arqueadas, que salta do Air Force One como se de um cavalo de rodeo se tratasse.
Hesitações
Eu sei que a franqueza é irrelevante em política. E que uma personalidade hesitante não inspira a confiança da maioria dos eleitores. Votaríamos nós em Sócrates, José, se este nos confiasse as dúvidas que inevitavelmente terá sobre as suas sonoras certezas? Ou em Menezes, Luís, se ele nos falasse exaltado das dificuldades que teve em passar a perorar em público daquela forma tão acentuadamente melíflua? Poucos de nós votaríamos. Foi por isso mesmo que experimentei alguma simpatia pelo sr. Sarkozy – embora apenas alguma, e nada política, convém que se diga -, quando soube que este, dias antes do casamento privado com a cantora esguia, teria enviado à sua ex um SMS hesitante – «infantil», dizem os críticos – dizendo-lhe que «se voltares, anulo tudo.» Tipos que passam por jamais fazerem coisas destas é que me arrepiam.
P.S. – Dizem-me que afinal o tal SMS não seguiu. Porém, o que importa é o papel da insensatez, da insegurança, da intranquilidade em política. São elas que podem humanizar um pouco os predadores. Sem que estes deixem de o ser, obviamente.
«Até se lhe embrulhava o estômago»
Publicado originalmente em Os Livros Ardem Mal
Em Os Amores de Salazar, Felícia Cabrita procurou desenhar para o austero ditador o reverso do familiar perfil fradesco. Uma «vida de D. Juan» feita de indícios, de suposições, de artifícios de imaginação, e, claro, também de uma dose de verdade que se perde na efabulação. Apresentado como remate de uma investigação de raiz, o livro mereceu mesmo, de Diogo Freitas do Amaral, um prefácio elogioso que o fez passar por obra reservada aos «historiadores imparciais» do futuro. E transformou-se rapidamente num êxito editorial.
Apresentado como resultado de década e meia de experiência jornalística vivida no contacto directo da autora com as parcelas das antigas colónias portuguesas, Massacres em África segue uma estratégia de construção aparentemente distinta. Mas cujo resultado prático acaba por se lhe assemelhar.
O livro aproxima alguns dos momentos mais sangrentos da história recente da África que se entende em português. Desde os massacres de Batepá, São Tomé, e da chacina da UPA, em 1961, ao de Wiriyamu, Moçambique, e aqueles que se seguiram ao golpe angolano de 1978, incluindo-se ainda informações sobre a morte violenta e inglória de Jonas Savimbi. Felícia Cabrita refere-os recorrendo a algum material de arquivo e a um conjunto de entrevistas, concedidas por testemunhas directas, sobreviventes e também executantes. A estes se refere quase sempre, aliás, com alguma compreensão, associando-os a actos que circunstâncias passadas determinaram mas que, de alguma forma, o tempo entretanto decorrido libertaria da responsabilidade histórica.
A escrita é fluente mas fácil, reconstruindo sem aparentes inibições os espaços sobre os quais a jornalista não possui informações. A busca do efeito melódico, a procura do impacto imediato da frase em prejuízo da sua beleza ou do seu rigor, definem um tom que prolonga o do livro sobre o Salazar «parte-corações». E o testemunho oral, veículo essencial para a construção de uma obra desta natureza que materializa a parte mais substancial do trabalho apresentado, resulta insuficiente, pois permanece imperfeitamente identificado, localizado e datado. Confrontado com estas falhas, o leitor vê-se então forçado a confiar plenamente na versão que lhe é contada. Coisa que, como é sabido, só por si não chega para aquilatar do valor documental de um determinado texto. Muito menos de um texto como este, que se reporta a uma das áreas mais sensíveis da memória e do rastro do nosso passado colonial
Pena é que a maior parte das pessoas que os irão ler julgará este livro, tal como aconteceu com o anterior, como um livro de história. Que de facto o não é: trata-se de uma compilação de reportagens aligeiradas sobre um tema que merecia maiores cuidados, inclusive do ponto de vista jornalístico. Talvez resulte razoavelmente como guião de um documentário concebido para a televisão ou para circular em DVD, e para ver apenas uma vez. Mas não como um livro para ficar.
Grandes decisões (3)
Engarrafamento aéreo em Havana
Por estes lados a notícia não teve destaque, mas vale a pena referi-la. Durante uma sessão na Universidade de Ciências Informáticas, em Havana, destinada a preparar as «eleições» para a Assembleia Nacional cubana solicitando dos estudantes o «voto unido», Ricardo Alarcón, membro do Bureau Político do Partido Comunista, viu-se confrontado com perguntas inusitadas e incómodas por parte dos estudantes. Porque não se explica ao povo em que consistem determinados projectos e planos de âmbito nacional? Porque pode um ministro manter-se 20 anos num cargo ainda que a sua gestão tenha fracassado visivelmente? Porque se proíbe aos cubanos a abertura de contas de e-mail no Yahoo ou no Google? Porque não podem viajar para o estrangeiros ou hospedarem-se em hotéis nacionais? A atrapalhação de Alarcón foi de tal ordem que a esta última pergunta respondeu considerando que «se todos os 6.000 milhões de habitantes do mundo pudessem viajar para onde quisessem, o engarrafamento aéreo no planeta seria enorme». Mais do que o carácter patético desta resposta, e simples enunciação das perguntas anuncia conflitos latentes que já não é possível esconder.
Antes que surjam as inevitáveis vozes que tentarão mostrar este episódio como prova da vitalidade democrática do regime castrista. Com um obrigado a João Tunes.
Sondagens
À hora do almoço passava repetidamente no rodapé rolante da SIC-Notícias a notícia (sic): «3,7 milhões de portugueses conhecem-se no hi5». Tantos quantos os consumidores nacionais de chá gelado, imagine-se. Presumo pois que todos os dias cerca de um terço dos meus compatriotas partilhe «vídeos fixes» e mostre aos outros fotografias de si próprio. Certo – eu é que devo andar pelos circuitos errados.
O passado é agora
Um pequeno post d’A Origem das Espécies chama a atenção para um apontamento saído no El País. Nele se refere um inquérito a 3.000 cidadãos, efectuado em Inglaterra pela cadeia de televisão UKTV Gold, o qual revelou estarem 23% deles convencidíssimos que Winston Churchill é um personagem de ficção e que nunca foi primeiro-ministro, enquanto 58% acreditam sem quaisquer problemas que Sherlock Holmes existiu de facto. 47% dos inquiridos considerou também que Ricardo Coração-de-Leão apenas existiu nos livros. Julgo que nenhuma pergunta se referia à existência – real ou imaginada – de Robin Hood e do Xerife de Nottingham. A reinvenção acelerada do passado é realmente um fenómeno deslumbrante. Como o é também a manipulação do passado na criação do presente.
Higiene oral
Se tivesse a certeza de que o Senhor Director-Geral me leria, escrever-lhe-ia uma carta registada e com aviso de recepção. Nela apresentaria os meus melhores cumprimentos e mais três queixosos parágrafos.
Protestaria no primeiro contra a inacção das autoridades diante do persistente hábito lusitano, digno de uma extra-europeia viela de casbah, de cuspir para o chão. Bem sei que os escarradores já não constam do inventário das repartições e que as novas gerações parecem salivar menos, mas consideraria inadmissíveis as imundas excepções com as quais nos cruzamos ainda com razoável frequência. Escreveria outro parágrafo sugerindo a criação de cursos de formação destinados a ensinar, àquelas pessoas que falam exalando nuvens de salpicos bocais, a forma de superarem esse asqueroso hábito. No último parágrafo, apresentaria uma queixa contra a falta de legislação capaz de controlar a prática rotineira – persistente até entre numerosos letrados – de folhear livros e jornais destinados ao público recorrendo à dose equilibrada de saliva que depositam laboriosamente no dedo médio de uma das mãos.
Terminaria a carta com os meus cordiais votos (atrasados, embora sinceros) de um óptimo 2008. Inseriria a folha num envelope que, por fim, fecharia recorrendo à minha humedecida língua. E passaria depois pela estação de correios mais próxima.
Xeque aos reis
Como a maioria dos portugueses com os ouvidos abertos, tenho andado um tanto empanturrado com as evocações do Regicídio. Escreve-se muito, por vezes demais e de um modo empolado ou redundante, para o interesse que o tema poderá despertar hoje no cidadão comum. Percebe-se a razão: monárquicos carentes de oxigénio, chefes de redacção à procura de assunto e circunspectos académicos com reduzido público confluem numa evocação que torna mais visíveis as suas crenças, que responde às suas necessidades ou que projecta o seu trabalho. E aproveitam-na enquanto podem.
Devido à profissão que tenho, caber-me-ia supostamente alinhar no cortejo. Mas é justamente essa condição que me obriga a falar pouco daquilo que conheço mal. Do tema sei, porém, o suficiente para perceber que tem falhado, ou faltado, a presença de uma perspectiva essencial para a compreensão do assassinato do rei Carlos e do príncipe Luís, dois cidadãos que nem sequer eram tiranos brutais ou empedernidos reaccionários. Uma leitura que permita reconhecer com algum detalhe o microclima cultural, marcado por um radicalismo profundamente laicista e antimonárquico, e completamente fechado a concessões, dentro do qual se formaram as convicções de homens como esses que, sem temerem pela própria vida, consumaram o acto sobre o qual passam agora cem anos. O que pensavam, que livros liam, em que lugares se reuniam, sobre o que falavam, que códigos compunham, naquele início de século, as convicções profundas de homens como Buiça, Costa, Aquilino e tantos outros? Porque eles não foram apenas republicanos extremistas e exaltados, ou pobres franco-atiradores de pendor anarquista, mas sim visionários maximalistas – como tantos outros na Europa do seu tempo –, que as circunstâncias da vida haviam transformado em adeptos da utopia de um mundo melhor que previa o inevitável fim dos reis e príncipes, símbolos físicos de um poder que entendiam promover a iniquidade. É fácil condená-los sem apelo ou transformá-los em mártires, como tem sido feito por estes dias, mas dará algum trabalho compreender a dimensão intensa, ainda que efémera, das suas certezas.
É a cultura, estulto!
Não foi a intervenção em si, mas sim aquilo que ela indicia. Na SIC, ontem à hora do jantar, as palavras de Ricardo Costa, director-geral adjunto da estação, a propósito da mudança de titular no Ministério da Cultura, tornaram muito evidente a promiscuidade instalada entre uma forma particular de «comentar» mediaticamente a actualidade política e um determinado modo de «fazer» a política à qual se refere essa mesma actualidade. Que primam pela superficialidade, cada vez mais submersos, uma e outro, no imediatismo dos raciocínios e na vulgar contabilidade dos votos e das influências.
Ao considerar irrelevante o papel do Ministério da Cultura («que até foi, durante bastante tempo, uma simples secretaria de Estado»), por este não contar «em termos de votos», achando até desproporcionada a projecção mediática que os seus actos normalmente têm, Costa não evidenciou apenas uma notória estreiteza de visão, parecendo não perceber o valor estruturante e simbólico das políticas culturais. Demonstrou também alguma falta de perspectiva, traduzida no esquecimento do impacto a médio prazo, repercutido nas mais diversas áreas, que têm as iniciativas governamentais neste domínio. Aqui como «lá fora»: afinal, ainda hoje se recorda a obra (discutível, mas obra de impacto) do ministro francês Lang.
Triste exemplo o de um «comentador político» que centra os seus comentários apenas nos resultados eleitorais, nas sondagens, nos títulos da imprensa, nas tricas de antecâmara. O drama é que não se trata apenas de um caso individual ou de um momento de dislate, mas antes de uma escola instalada, transversal a um certo jornalismo e a uma determinada forma de fazer política, que todos os dias nos zumbe aos ouvidos. E que por vezes atordoa.
De novo e de novo a língua
A revista Manière de Voir dedica o último número (Fevereiro-Março) ao que chama «a batalha das línguas». Trata-se desse confronto em crescendo, vivido neste momento à escala planetária, que associa a cartografia dos falares a uma ordem política e económica que se sobrepõe à liberdade das escolhas individuais. Em «Une idée en marche, la latinité», Philippe Rossillon, actual secretário-geral da União Latina, fornece mesmo um exemplo dramático desta realidade, na qual a exclusão em relação a uma língua pode até conduzir ao mais extremo desespero: em Itália foram já registados muitos casos de depressões nervosas, e até de suicídios, ocorridos com alunos cujos acasos da vida escolar os haviam forçado à aprendizagem do francês em detrimento do inglês, afastando-os aparentemente de uma vida profissional com boas expectativas.
Nesse artigo, Rossillon sublinha a necessidade de elaborar um padrão de resposta a este estado de coisas, assegurando a força de outras opções. O seu ponto de vista, favorável a um retorno do protagonismo das línguas novilatinas, merece a atenção desde logo porque exclui, o que me parece do mais elementar bom senso, qualquer hipótese de revanche do francês (hoje a língua materna de «apenas» 77 milhões de pessoas, contra, por exemplo, os 358 milhões do espanhol e os 170 milhões do português). Depois porque propõe um esforço conjunto das línguas de matriz latina fundado numa tomada de consciência de um perigo partilhado – a larga maioria dos seus falantes podem ver-se forçados, em breve, a comunicarem entre si em… inglês – e na necessidade destas se orientarem, um pouco como o fazem já os países escandinavos, para uma reciprocidade nos domínios linguístico e cultural indispensável para a sua sobrevivência neste território de batalha. E, por fim, porque entende que o seu papel neste combate implica uma mobilidade, uma modernização e um esforço de aproximação capazes de fundarem uma verdadeira alternativa à fluidez pragmática do inglês. Língua que conta com 322 milhões de native speakers mas é falada, em larga medida devido à posição hegemónica da cultura americana e à sua adaptação à inovação tecnológica, por pelo menos 530 milhões de seres humanos.
Grandes decisões (2)
Eles já chegaram
Vêm aí os Russos! (The Russians Are Coming, The Russians Are Coming, realizado por Norman Jewison e estreado em 1966) foi um dos produtos fílmicos da Guerra Fria mais divulgados no mundo ocidental há cerca de quarenta anos atrás. Em registo de paródia, ele partia da presunção, então espalhada no ocidente, de um carácter insuportavelmente maléfico de qualquer cidadão soviético vivo e das acções do governo que lhes orientava os passos. Ainda que, no filme, o pavor dos habitantes do Massachusetts que inesperadamente viram chegar os marinheiros russos fosse desproporcionado em relação às suas intenções não-agressivas. Tenho a impressão de voltar a sentir alguns dos fumos desse tempo de medos quando vejo, oiço e leio algumas das notícias sobre os exercícios militares navais que, neste momento, a marinha de guerra russa realiza nas águas do Mediterrâneo e do Atlântico.
Habash
Poucos repararam na morte recente de George Habash. Mas foi ele o fundador e, ao longo de décadas, o dirigente máximo da Frente Popular para a Libertação da Palestina, a facção radical – para a época, naturalmente – que ao longo da década de 1970 materializou, dentro da OLP, uma oposição relativamente leal à direcção moderada de Yasser Arafat. Manteve-se, durante anos, como o rosto visível de uma linha de inspiração marxista que chegou a deter uma razoável capacidade de manobra no mundo árabe. E também algum capital de simpatia entre a esquerda e a extrema-esquerda do Ocidente (incluindo-se nesta parte da portuguesa). Em 1967, quando Habash fundou a FPLP, o «socialismo árabe», tendencialmente laico, vector de um pan-arabismo preocupado com a injustiça social, parecia ainda ser uma alternativa próxima e possível. E o «radicalismo» da FPLP não o excluía. Por muito que possa custar hoje admiti-lo, a falência dessa versão arabizada e cheia de cambiantes da utopia socialista abriu caminho, como recordou Samir Kassir, à afirmação dos grupos religiosos intransigentes que dominam actualmente boa parte do Islão. E que asseguraram já uma regressão cultural e social iniludível. Provavelmente as democracias ocidentais deveriam ter considerado de uma forma menos timorata e agressiva o programa político desse «socialismo».
Por exemplo
O ex-chanceler social-democrata alemão Helmut Schmidt, de 89 anos, e a sua mulher Loki, de 88, foram ambos processados por autoridades policiais de Hamburgo após terem sido denunciados por uma organização de vigilância e pressão de não-fumadores – sim, parece que na Alemanha já há disto – que os acusa de terem fumado durante um acto público num teatro da cidade. De acordo com o El País, Schmidt foi operado por duas vezes devido a problemas cardíacos mas fuma sem parar cigarros mentolados e gaba-se mesmo de o fazer como um acto de desobediência civil e expressão da sua própria liberdade («eu só não fumo na igreja», declarou há dias). Loki Schmidt é um pouco mais diplomática e objectiva: «os médicos aconselham-nos a não deixar de fumar pois isso provocaria uma situação de stress para o nosso corpo».
Coimbra pelo direito à cultura
Esta semana foi divulgado publicamente um documento assinado por um amplo grupo de cidadãos de Coimbra com responsabilidades e com actividade na área de cultura, destinado – esgotadas que parecem estar todas as possibilidades de um diálogo construtivo e razoável com os responsáveis autárquicos – a chamar a atenção para o estado trágico e calamitoso em que se encontra a política cultural municipal. Nada melhor, para se entender o sentido do documento, do que segui-lo de perto: «Coimbra é hoje uma cidade amarfanhada do ponto de vista cultural, que só não se tornou absolutamente insignificante a nível nacional graças à actividade que, no limiar da sobrevivência, os poucos agentes culturais que ainda restam conseguem ir desenvolvendo. A Câmara Municipal já não se limita a não apoiar devidamente a actividade cultural que aqui é feita; assume-se, pelo contrário, como um elemento dificultador e tendencialmente destruidor do potencial de criação artística que a cidade possui e que é uma das suas principais mais-valias.»
Quem vive em Coimbra ou conhece bem a cidade tal qual ela é hoje, e tem uma noção actualizada e democrática do que pode e de qual deve ser o lugar dos executivos municipais na dinamização e na modernização cultural, sabe bem do que se fala quando se desenha um panorama funesto daquilo que a este nível ali (aqui) se tem vindo a passar. O que é tanto mais grave quanto se sabe que a «cidade dos estudantes» é principalmente habitada por quadros de formação universitária, bem como por uma classe média e por uma população juvenil bastante numerosas, que possuem expectativas culturais, de uma natureza urbana e crescentemente globalizada, totalmente incompatíveis com a dimensão popularucha e kitsch que neste domínio a gestão camarária tem assumido. Voltada quase exclusivamente para um público semi-rural, adepto de um certo «folclorismo» passadista e minoritário já em termos demográficos, a Câmara de Coimbra nem sequer parece aperceber-se da forma como essa atitude cria um mal-estar que prejudica a sua própria imagem. No presente e para o futuro. É importante – e urgente – contrariar este estado de coisas.
Este manifesto público de preocupação e protesto pode ser lido na íntegra no blogue Amigos da Cultura. Onde é possível também saber quem o subscreveu e juntar-lhe novas assinaturas. E acompanhar o debate agora aberto.
Revolução de veludo
Uma das conclusões pode surpreender-nos. A outra não.
«Os professores são os profissionais em quem os portugueses mais confiam e também aqueles a quem confiariam mais poder no país, segundo uma sondagem mundial efectuada pela Gallup para o Fórum Económico Mundial. Os professores merecem a confiança de 42 por cento dos portugueses, muito acima dos 24 por cento que confiam nos líderes militares e da polícia, dos 20 por cento que dão a sua confiança aos jornalistas e dos 18 por cento que acreditam nos líderes religiosos. Os políticos são os que menos têm a confiança dos portugueses, com apenas 7 por cento a dizerem que confiam nesta classe.»
Público, 25/1/2008 [os sublinhados são meus]