Tenho encontrado por aí, em alguns artigos de opinião, embora escassos, mas principalmente em apontamentos e comentários das redes sociais, referências à eventualidade de os Estados Unidos da América caminharem a passos largos e muito rápidos para um guerra civil. Por vezes, este padrão de comentário disfarça um certo comprazimento, admito que algo inconsciente, mas presente nas entrelinhas, situado entre um «eles afinal merecem» e um «pode ser que assim o assunto se resolva». Não considerando agora o facto de as guerras civis serem as mais terríveis, mortíferas e traumáticas de todas as guerras, com um nível de destruição material e espiritual que raramente outras produzem, importa salientar que elas deixam nos povos um rastro de medo, pesadelo e sofrimento que, associado a desejos de vingança, se prolonga por gerações.
Também tivemos uma aqui em Portugal, entre 1832 e 1834, que se manteve na memória coletiva por muitas gerações. Os Estados Unidos da América tiveram outra, bem maior e mais ampla – calcula-se que com um mínimo de 750.000 mortos, além de muitos milhões de feridos e de deslocados – entre 1861 e 1864. Ela viu aquele padrão de memória reforçado pela forma como a ficção literária e a indústria cinematográfica, além dos estudos históricos, mostraram, ampliando-as, as suas brutais ondas de choque. Além disso, a sociedade norte-americana convive com uma disseminação de forças militares e de de milícias armadas que impediriam uma guerra regular e apenas localizada. Não pensem nisso, a resistência na América passará, sem dúvida, pela difícil e aturada defesa da ordem constitucional e por graves e constantes manifestações de protesto, na rua e fora dela, da sociedade civil, mas não por uma nova guerra civil. Felizmente.