Polícia: ainda que mal pergunte

Na pele de sujeito diariamente empenhado na vida da ‘civitas’, apesar de não poder ficar indiferente às movimentações reivindicativas da polícia, admito que, sabendo da forma como estas estão hoje a ser instrumentalizadas pela direita – e mesmo considerando a justeza de algumas das suas reivindicações materiais – tenho procurado não olhar muito para as imagens que delas nos chegam. Fi-lo ontem e o que vi apenas confirmou aquilo que já sabia e, para não me incomodar, fazia por evitá-lo.

Antes de avançar, e para evitar generalizações devo esclarecer um aspeto: a PSP tem 22 mil membros, mas o seu setor mais «radical», o Sindicato Nacional da Polícia, apesar do que o nome sugere, apenas tem 1350 sócios. Dito isto, importa esclarecer que, apesar da insatisfação alargada, e de algumas manifestações agregarem um número maior de agentes, é este setor, associado a agentes de extrema-direita, que tem procurado levar a luta dos polícias a um enfrentamento direto e mais extremado com o Estado e, nesta fase, também a uma interferência nefasta e perigosa nas eleições legislativas.

Ora o que vi ontem, durante uma reportagem televisiva sobre movimentações deste setor, nomeadamente marchas e cercos à Assembleia da República, foram vagas de homens – sim, quase não se vêem ali mulheres – a desfilar de forma abertamente marcial, muitos de cabelo rapado e blusão de couro com botifarra, bastantes trajados de negro, olhando os jornalistas que filmavam de forma ostensivamente desafiadora, imprópria da ordem democrática. Ainda que mal pergunte: isto lembra o quê?

[Originalmente no Facebook]

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