Reforma e idadismo

Desde que há cerca de ano e meio fechei a fase da minha vida pessoal como professor no ativo e passei à condição de «aposentado» – um quase eufemismo utilizado para mascarar a dimensão negativa, em regra pejorativa, muitas vezes socialmente associada à palavra «reformado» – começando, como é natural, a ter uma vida algo diferente da que antes tinha. Não que me falte trabalho para realizar ou projetos para desenvolver, e alguns amigos já nem me devem poder escutar a repetir que trabalho mais agora do que antes, o que até é verdade, embora num horário bem mais maleável e sem ter de cumprir os fretes impostos pela burocracia, mas porque mudei inevitavelmente alguns dos meus hábitos, ritmos e trajetos.

Isto não me isenta, todavia, de sofrer ondas de choque impostas pela condição, sendo uma das que incomoda um tanto a relutância de muitas pessoas a mencioná-la sequer perante mim. Presumem que corresponderá sempre a uma degradação das condições de vida e que é preferível «não falar nisso». O que entendo, até porque já fiz a mesma coisa com pessoas mais velhas. Realmente perturbante, porém, é circular por espaços nos quais se concentram, durante o dia, muitos homens e mulheres na condição de reforma, vendo a forma como a maioria desperdiça o tempo sem nada de dinâmico e produtivo fazer ao tempo alargado do qual agora dispõe, vivendo-o em muitos casos em depressão e na maior solidão.

Um dos problemas do idadismo, o mal social traduzido numa depreciação e numa marginalização de pessoas devido ao seu acumular dos anos, consiste, como se sabe, numa combinação de preconceitos generalizados com o seu distanciamento do aparelho produtivo, dado já não serem considerados lucrativos ou mesmo úteis. Mas igualmente negativa e prejudicial é a forma como elevado número de reformados contribui, ele próprio, para esse estatuto, ao conformar-se a uma completa inatividade. É verdade que nem todos o podem evitar, mas em muitos casos depende da vontade de continuar a interagir numa dimensão positiva de comunicação e de esperança. Por mim, faço esta ginástica todos os dias.

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