Deparei hoje com um relatório da PIDE datado do ano de 1972 no qual um panfleto contra o regresso da Queima das Fitas que circulou em Coimbra em maio desse ano vinha com a sua autoria completamente trocada. Sei-o melhor que ninguém, pois foi o último que escrevi para os chamados «Núcleos Sindicais de Base», antes de ser internamente impedido de continuar a fazê-lo por a minha escrita ser acusada de «demasiado literária». Tratava-se de um grupo de estudantes filo-maoistas, na altura ainda muito poucos, dos quais fazia parte e fora um dos fundadores em Coimbra.
O relatório tem desde logo um erro, pois após muita e acalorada discussão, o «de Base» tinha já sido retirado da designação por ser considerado algo «guevarista». Mas o lapso total e que denuncia a dimensão absolutamente vesga da PIDE-DGS é que nele se consideram como responsáveis pelos NSB pessoas que eram membros do PCP/UEC e da então Comissão Pró-Reabertura da AAC (entretanto fechada pela polícia), e até um futuro presidente de Cabo Verde, então trotskista. Aquela, precisamente a tendência contra a qual aquele grupo de jovens certíssimos das suas razões se tinham erguido, por a considerarem «reformista e revisionista».
Este apontamento deve traduzir uma linguagem cifrada para a maioria das pessoas que aqui me lê, mas aqui fica para alguém a quem possa interessar. E, para memória futura, ficará também a lembrança de que já hoje me ri um tanto atrasado à pala do obtuso erro da polícia do regime.