Não há volta a dar: os resultados das eleições do dia 30 significaram uma derrota, com uma dimensão que nem os mais pessimistas ou clarividentes conseguiram antever, do PCP e do Bloco de Esquerda, os dois maiores partidos situados à esquerda do PS. Pior, todavia, que essa derrota, já expetável para quem não vivesse cego pelas suas certezas, são sobretudo dois fatores. Em primeiro lugar a sua dimensão, que imporá uma menor capacidade de influência política institucional, agora transferida para o espaço da rua. Em segundo a aparente resistência, da parte das direções de ambos os partidos, a desenvolverem um processo de crítica e de autocrítica capaz de impor um reconhecimento dos erros táticos e estratégicos, sem empurrarem para os ombros dos outros responsabilidades que são próprias.
E, todavia, para a democracia e as políticas progressistas e solidárias que a esquerda contém no seu ADN e na sua indispensável função histórica – tomada no seu todo, que inclui naturalmente o PS, malgrado a parte deste associada aos grupos de pressão e ao mundo dos negócios –, esse brusco enfraquecimento é dramático e deverá ser rapidamente atalhado. Não me parece, por isso, que a necessária crítica pública da «esquerda da esquerda» feita por pessoas de esquerda deva ser levada a cabo num sentido essencialmente destrutivo e de acusação. Esquecendo, aliás, que aqueles dois partidos não são «partidos de personalidades», suscetíveis de resolver os seus problemas através de uma guerra dos tronos, mas coletivos que se pautam por um trabalho conjunto, assente num longo e empenhado trajeto histórico de luta, reflexão e compromisso.
Não, o Bloco e o PCP não podem insistir em atirar as culpas do que sucedeu apenas para cima dos outros – sejam eles o PS, sobre o qual têm desenvolvido uma inaceitável teoria da conspiração, ou a volatilidade supostamente acéfala de muitos eleitores que não subscreveram as suas escolhas – tendo forçosamente de pensar as razões próximas e distantes, epidérmicas e profundas, da sua colossal derrota e do seu agora inevitável recuo político. Mas também não podem ser encarados, por quem à esquerda faça a sua crítica, como partidos mais ou menos «desmiolados», aparentemente incapazes de se renovarem e de voltarem a ter, ou mesmo de ampliarem, a influência que tiveram. São ambos, em conjunto com outras forças, imprescindíveis para a nossa democracia e, de imediato, para ajudarem a colocar um freio às inevitáveis tentações dessa maioria absoluta que na realidade ajudaram a erguer.
No próximo sábado publicarei um artigo mais completo sobre este tema.
Rui Bebiano