Curar o cansaço em In Guezzam

Como acontece com boa parte das pessoas com quem me relaciono nos espaços de sociabilidade que nos últimos tempos, devido às circunstâncias, mais tenho frequentado – como o Zoom que se multiplica por si só, o Email que jamais vai ao zero, o Instagram, o Twitter, o Messenger, o WhatsApp, o Doodle, o Academia.edu ou o Facebook, esses lugares onde é possível sentir por estes dias o rumor crepitante das multidões – tenho experimentado um cansaço constante, determinado pela progressão geométrica de trabalho a eles associada.

Não falo só das janelas carcerárias do Zoom, em reuniões e aulas praticamente diárias, por vezes com a duração de largas horas, que induzem um cansaço peculiar sobre o qual até já foram publicados estudos científicos. Falo também da forma como eles se tornaram «a» solução natural para todas as necessidades de encontro, tornando-se uma constante na nossa paisagem. Falo de como o email cresceu de forma exponencial ao substituir quase todas as conversas de viva voz. Falo de como em nome do teletrabalho se multiplicou a necessidade permanente de responder a inquéritos em linha (daqueles que «apenas demoram seis minutos», mas que se arrastam por trinta). Falo de ler sucessivas atas de reuniões e de preparar diferentes ordens de trabalho. Falo de solucionar problemas pessoais que por escrito se tornam muito mais difíceis de resolver do que quando eram tratados numa breve conversa. Com a agravante de agora não podermos dizer, sob risco de sermos considerados mentirosos ou mandriões, que «não liguei o computador», que «não vi o email», que estivemos incontactáveis em áreas sem acesso à rede.

Aparentemente, agora só se justifica que não respondamos se estivermos entubados numa unidade de cuidados intensivos ou, em princípio, se tivermos morrido. Tudo isto cansa, cansa terrivelmente, e nada nos garante que, passada a pandemia, instituições, empresas e pessoas que gostam de se sentir escravas ou de escravizar as demais, não resolvam que podemos continuar a viver nesta prisão porque é tudo mais fácil, rápido e supostamente eficaz. Direito a uns raios de sol consistentes só lá para agosto, se tivermos o cuidado de passar as férias numa obscura estalagem do povoado de In Guezzam, mesmo na fronteira da Argélia com o Niger, onde me garantem não haver grande sinal de wi-fi.

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