8 de Março: celebração e crítica

Foi muito significativa e de grande importância política a forma participada como em Portugal foi vivido este 8 de Março, dia no qual por todo o mundo se lembra e prossegue a luta longa, difícil e necessária pelos direitos das mulheres e pelo seu combate por uma efetiva igualdade. Longe ainda da dimensão esmagadora que o movimento tem hoje no território do Estado espanhol, por cá ele tem vindo a crescer, a abranger um leque cada vez maior de mulheres, muitas delas ativistas, mas também pessoas comuns, a agregar um número crescente de organizações, e, o que é sempre importante, a chamar a atenção da comunicação social, elemento imprescindível neste tempo que atravessamos.

É importante também porque traduz uma consciência clara de que uma posição socialmente igualitária das mulheres não se traduz apenas na conquista de direitos políticos e no domínio do trabalho – como insiste em proclamar o MDM – mas igualmente na afirmação de uma voz própria, no plano social e no plano cultural, que exclua toda a subalternidade em relação ao padrão do patriarcado, ainda tão presente mesmo entre muitos homens e mulheres que se declaram defensores dos «direitos da mulher». E é importante ainda para combater a transformação do Dia Internacional da Mulher, do combate pelos seus direitos, num momento de mera naturalização do «eterno feminino», que representa uma outra forma de subalternização. Ainda bem que o movimento cresce e espera-se que cresça ainda mais num futuro próximo.

Todavia, e agora serei menos consensual, existem três aspetos que traduzem opções de organização das quais discordo e que foram, a meu, fatores menos positivos. Não os referi por estes dias, pois não queria que a menor palavra diminuísse o impacto do trabalho de tantas mulheres militantes que empenhadamente e com grande coragem prepararam e deram corpo ao movimento.

A primeira foi a consideração deste como uma «greve», instrumento fundamental, mas extremo, dos movimentos sociais que não pode ser banalizado, reduzindo o seu peso. Desde há décadas que aplico esta posição igualmente à luta sindical. A segunda foi a separação clara, na organização de muitas das iniciativas, das mulheres e dos homens. Eu sei que as protagonistas devem ser as mulheres, mas passar homens feministas, que os há muitos, para segundo plano, é um fator que fragiliza o alcance do movimento. Por fim, a terceira, menos importante, mas presente, refere-se à atuação algo agressiva de alguns grupos, minoritários mas visibilizados pelo ruído que por vezes produzem, que contribuem para transformar esta luta, não num movimento alargado, capaz de juntar cada vez mais mulheres comuns, e homens que a apoiem, mas numa intervenção que se crê vanguardista e exclusiva. Movimento social algum vence a sua luta se não souber agregar apoios, optando antes por cavar desnecessárias trincheiras.

Mas é claro que o balanço do dia foi, entre nós, muitíssimo positivo, uma vitória que abre caminho para o crescimento futuro. A luta pela efetiva igualdade de género é uma longa estrada que não se percorre sem obstáculos e canseiras, mas não parará de se afirmar. Até ao dia ideal no qual deixe de ser precisa.

Rui Bebiano

Fotografia de Alice Barcellos
    Atualidade, Democracia, Direitos Humanos, Opinião.