Pensem nisto por um minuto

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Este é um post-catástrofe. Números divulgados apontam para que cerca de 20 por cento da população portuguesa sofra de uma doença «que se caracteriza por tristeza mais marcada ou prolongada, perda de interesse por actividades habitualmente sentidas como agradáveis e perda de energia ou cansaço fácil». Isto é, de depressão. Estes dados reportam-se a estimativas que por sua vez se fundam nos casos já diagnosticados. Na realidade, os números tenderão a subir quando puderem ser consideradas as situações de fronteira, que colocam quem com elas convive numa posição de grande vulnerabilidade, ou os casos não declarados, mascarados através de atitudes erráticas que resistem à melancolia recorrendo a uma «fuga para a frente». Mas trata-se aqui de um vigor à beira das lágrimas, perto de se transformar, ao primeiro pretexto, no seu contrário. Ou de testar os seus próprios limites.

Em Janeiro, o mais tardar em Fevereiro, quando o bolo-rei estiver comido e já não houver bacalhau para meter no microondas, quando os cintos começarem verdadeiramente a apertar, o panorama será agravado, concorrendo depressão e recessão na propagação da infelicidade. Desta nascerá o desespero e a prostração, mas também, acreditem, a ira. Diminuirá então a produtividade e crescerá o desprezo por uma ordem injusta, propagando o anseio de uma mudança radical. Cidadãos comuns transformar-se-ão em hooligans ou em maximalistas para poderem sobreviver. E não será apenas à noite, a coberto da escuridão. Se virem bem os diligentes responsáveis pelas agências de rating, bem como os agentes económicos e os dirigentes políticos que se lhes submetem sem resistência, despeito e desordem são factores pouco favoráveis ao crescimento económico e à paz social que supostamente o deverá sustentar, e dos quais tanto cuidam. Não é preciso ser-se adivinho ou profeta para perceber isto. Não sei se dentro deste caldo de cultura crescerá a semente da violência se o ovo da serpente, ou se ambos, mas nada de bom se anuncia. Pensem nisto por um minuto.

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