Da «pequena forma de dizer não»

Starostin

Os jornais desportivos já quase não falam dos quatro irmãos Starostin. Afinal Nikolai, o mais velho dos quatro, morreu há já década e meia, aos 96, encerrando definitivamente um ciclo de glória, perseguição e resgate que durou quase meio século. Em conjunto com Aleksandr, Andrey e Pyotr, constituíra, na década de 1930, o núcleo motor da equipa de futebol do Spartak de Moscovo. Os «irmãos Starostin» foram por esses anos terríveis – os do pior período das purgas estalinistas e das grandes fomes – os mais populares jogadores da União Soviética, responsáveis pelo futebol tecnicista, ao «estilo europeu», do Spartak de Moscovo. Os seus êxitos rapidamente incomodaram o regime, que apoiava as outras duas grandes equipas da capital, o CSKA, clube do exército, e o Dynamo, do NKVD/KGB, ambos partidários de um jogo mais atlético, mas não o Spartak. Os Starostin acabaram por ser acusados de «vedetismo» e, a dada altura, indiciados por integrarem uma pseudo-conspiração destinada a assassinar José Estaline.

A enorme popularidade de que dispunham salvou-os do pelotão de fuzilamento – a acusação foi convertida numa outra, menos grave – mas não de passarem dez anos em campos do Gulag, onde «terminaram a carreira» jogando futebol em equipas de prisioneiros. Alguns testemunhos referem que para a sua desgraça não terá contribuído pouco uma derrota humilhante um dia imposta pelo Spartak ao Dynamo, numa altura em que neste actuava um jovem de fugaz carreira desportiva de nome Lavrenti Beria, nem mais nem menos do que o futuro «comissário dos assuntos internos», o chefe da polícia politica. Nikolai e os irmãos, bem como outros responsáveis, jogadores e adeptos do Spartak envolvidos na mesma purga, apenas foram definitivamente reabilitados, alguns deles a título póstumo, na época de Kruchtchev. Toda a história, muito útil para perceber uma «pequena forma de dizer não» conservada como instrumento de resistência na era de Estaline, é-nos contada em Spartak Moscow. A History of the People’s Team in the Workers’ State, de Robert Edelman. A Cornell University Press publicou-o em 2009.

    História, Memória.