Para não se dizer que não falei do H1N1

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Tenho dificuldade em fazer previsões sobre as consequências do surto pandémico de gripe A que se prevê irrompa em Portugal logo que o tempo comece a arrefecer e as andorinhas que restarem partam de novo para África. Por simples ignorância. Os especialistas dizem que no «pior dos piores» cenários morrerão 8700 pessoas em Portugal, mas logo acrescentam que o cenário «deve ser encarado sem dramatismos». Afinal, parece que a gripe comum todos os anos mata quase duas mil almas, e ninguém, salvo alguns hipocondríacos, vive atormentado com isso. Limito-me pois a olhar para as previsões e a tomar o sumo de laranja que recomendava a minha avó, com a vaga sensação de que, fazendo parte de um grupo de risco, deverei ter particular cuidado em evitar correntes de ar e frio no pescoço.

Existe, no entanto, um lado do problema que é preocupante. A comunicação social agarra como sempre o filão da desgraça e todos os dias efabula cenários apocalípticos de devastação e crise: ruas desertas, fábricas paradas, escolas sem aulas, comércio fechado, estádios vazios, as traineiras em terra e os aviões também. Nas ruas, os escassos transeuntes circularão de máscara e luvas, e o paracetamol valerá mais que petróleo. Os cidadãos passarão em casa o seu tempo de quarentena, partilhando boatos por e-mail, dormindo em camas separadas, trocando os beijos por adeuzinhos, recusando até participar no funeral dos parentes mais chegados. Os cenários propostos têm a ilimitada imaginação por limite. E fazem-no com uma tal intensidade, de maneira tão pessimista e repetitiva, que, chegada a hora, quando alguns cuidados forem necessários, já poucas pessoas darão grande valor às notícias e toda a gente circulará pelas ruas de manga curta e cabeça ao sol, tossindo para cima dos outros. A vaga de alarmismo por antecipação que estamos a viver pode dar maus resultados.

    Atualidade, Devaneios, Olhares.