A meretriz e os alquimistas

Singular preocupação tem retirado o sono aos naturais da minha cidade. A razão parecerá fútil, mas é séria: sabendo-se que o equipamento tradicional da sua principal equipa de futebol é negro com os números dos atletas gravados a branco, uma imposição comercial acaba de impor o dislate de transmutar o branco em ouro. E se, do ponto de vista cromático, o branco implica tanto a soma como a ausência de todas as cores, balanceando simbolicamente entre a força do dia, a pureza e a pulsão da morte, já o dourado evoca a autoridade e o fogo purificador. O que não é obviamente a mesma coisa. A ordem natural do mundo – à escala local, naturalmente – está assim posta em causa, tendo por isso um antigo vice-presidente do clube escrito em artigo publicado, dando voz à aflição dos conimbricenses, que ao permitir-se a inserção dos números dourados nas camisolas da Académica estará esta «a prostituir-se». A força do argumento irrompe então, esmagadora: «com esta medida, fica claro que a Briosa está à venda e que no deliberado conspurcar da sua centenária e prestigiadíssima camisola está a leilão também a sua ‘alma’ de instituição sui generis, ora metamorfoseada em banal meretriz, que sobe o desce a saia, sem pudor ou vergonha, ao sabor das suas conveniências e necessidades financeiras». Argumento que, sem dúvida alguma, se revelará incontroverso.

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