Elementar, meu caro Hugo

Hugo Chávez suspeita que Simon Bolívar (nascido em Caracas, Venezuela) não morreu há 180 anos pela influência danosa do bacilo de Koch, tal como ardilosamente contam os livros de história, mas sim envenenado com arsénico, ou então baleado. Para confirmar a tese, mandou exumar «o esqueleto glorioso», como lhe chamou, e reuniu 50 especialistas da Fiscalía General e do Cuerpo Técnico de Policía Judicial. A televisão venezuelana filmou o solene momento e, célere como é seu dever, divulgou-o à escala do planeta. Mas claro que não existe suspeita de crime – elementar, meu caro Hugo – sem que se não pense logo no suspeito. E a primeira pergunta, a eternamente clássica, é… quem lucrou de forma mais óbvia com a morte do «Libertador»? A pessoa está já identificada e desta vez não foi o mordomo: trata-se do general Francisco de Paula Santander, que viu a luz do dia em Villa del Rosario, Colômbia, e enfrentou por diversas vezes os ímpetos belicistas de Bolívar, sucedendo-lhe em nome do sector civilista ao qual este se opusera. Não sei se estão a ver: pegamos na naturalidade dos dois generais, no seu trajecto secante, na crise política actualmente vivida na região, e depois… é só fazer as contas. O historiador venezuelano Elías Pino Iturrieta afirmou a propósito, ao El País, que «não existe o mínimo fundamento científico que justifique este espectáculo nocturno», mas que importa tal princípio face à suspeita e às necessidades do omnisciente coronel? Aguardam-se «conclusões» a condizer.

Duas adendas:
– Tudo isto se passou no dia 16 de Julho. Ontem mesmo na Wikipédia em português era já possível ler: «Pelo que se descobriu após uma autópsia de Simon Bolívar, sua verdadeira morte foi causada por um envenenamento na digestão da água, que possuíam altas doses de arsénio.» O artigo da versão em inglês não fala disto.
– Para quem se interesse por estes pormenores: Santander caiu gravemente doente e morreu de causa não esclarecida em 6 de Maio de 1840, no próprio dia em que fez o discurso de aceitação da sua recandidatura à presidência de Nova-Granada (futura Colômbia). Durante a autópsia encontraram-lhe ainda duas marcas de bala e uma de lança.

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