Erros seus, má fortuna

Qualquer professor, independentemente do grau do ensino no qual exercita a profissão, depara-se a todo o instante com problemas da comunicação associados a erros do português escrito, alguns deles crónicos, que os seus alunos cometem. Quem andasse distraído poderia, no entanto, pensar que no ensino superior essa praga – que tanto deforma os textos e prejudica a sua clareza – se sentiria bastante menos que noutros graus de ensino, mas os últimos anos, e os últimos cinco ou seis em particular, terão servido para desfazer tal ideia. Lemos agora relatórios, trabalhos, testes escritos, e-mails dos alunos, nos quais as palavras incorretamente escritas, a par de uma sintaxe cada vez mais trôpega ou simplificada, por vezes inadequada ao padrão de discurso no qual se está a procurar comunicar, representam um verdadeiro tormento, prejudicando a expressão fluida mas rigorosa do conhecimento.

Saliento dois erros – muito vulgarizados, e não apenas nas universidades – que admito serem os meus ódios de estimação. O primeiro, particularmente comum, tem a ver com a confusão entre o «há», forma do presente do indicativo do verbo haver, e o «à», a resultante da contração da preposição «a» com o artigo definido feminino «a». A esta segunda possibilidade está ainda associada uma outra variante do erro: aquela que troca um correto «à» com um desacertado «á», confundindo o acento grave com o agudo. (Errado: «Hoje á rissóis».) O meu segundo ódio persegue-me há bastante mais anos e prende-se com a troca entre as formas verbais do pretérito perfeito («lembrasse», «comesse», «achasse») e a conjugação pronominal reflexa («lembra-se», «come-se», «acha-se»), cuja confusão se torna ainda maior porque num caso e no outro as palavras são pronunciadas de forma muito diversa. (Errado: «Ela achasse inteligente».)

Pode ser que este post, para o qual conto ir remetendo no futuro, ajude a reduzir – com ou sem acordo ortográfico, que não é para aqui chamado – as situações de leitura que impõem tantos momentos de mau português e de deformidade literária. Deixando-me por vezes à beira de um ataque de nervos. Embora não esteja sozinho nesta luta (tracinho.com).

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