Da decadência do Entrudo

« – O Entrudo está perdido. Eu lembro-me que, sendo rapaz, houve tal Entrudo na minha rua, que por conta das peças que ali se fizerão, houverão vinte brigas e quatro mortes. Então havião homens de bigodes; porém, hoje, estes Peraltas, ainda que lhes botem três arrates de polvilho no topete, fazem uma cortesia, e vão andando seu caminho. Oh tempora! Oh mores!
(…)
– Pois eu lembro-me que em hum Entrudo gastei três arrobas de polvilhos e nove arrates de grangea; todos os vestidos ficaram perdidos, as alcatifas, os cortinados, e as cadeiras, nunca mais prestarão para nada. Eu andei toda a Quaresma com huma doença nos olhos, que me embaraçou de ir ver as Procissões. Ah, Senhores, muito me diverti aquelle Entrudo!»

Comedia nova, intitulada O Entrudo desabuzado em Lisboa, Lisboa, off. de Domingos Gonsalves, 1783

    Recortes.