Por uma nova gramática do bem comum

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A sobrevivência da democracia depende da vitalidade do espaço público. A ideia não é nova, mas o filósofo bilbaíno Daniel Innerarity fez dela o eixo deste ensaio. «Fazer política», diz-nos, «é hoje semelhante ao que fazia aquele indivíduo que de súbito bradava num restaurante “Pssst!” […] em voz tão alta que todos olhavam para ele e cessava o ruído das conversas». O alheamento do cidadão comum em relação aos projectos colectivos, o seu silêncio diante dos que falam em seu nome, ficaria a dever-se sobretudo à confusão instalada entre público e privado, à «privatização do público» e à «politização do privado», que tendem a diminuir o alcance da responsabilidade social e a estimular o individualismo. Neste O Novo Espaço Público expõem-se o cenário e os intérpretes do estado de desresponsabilização em que vivemos, insistindo-se no recuo das preocupações com o público, substituídas por uma valorização excessiva das identidades ou então pelo populismo. Ambos determinados pela «irrealidade dos meios de comunicação» e por uma intensa manipulação da História e da memória colectiva. Mas não se deixa esmagar pelo pessimismo. Fala-nos por isso da construção de uma «cultura pública comum», de uma nova ágora em condições de impor a renovação da experiência política e de impedir que esta se reduza à mera gestão «realista» do presente, trocando a acção colectiva e o debate criador, como já advertira Hannah Arendt, pelos automatismos próprios da produção e do consumo. Seguindo Habermas, Innerarity evoca então a necessidade que as sociedades actuais têm de «um centro virtual da sua autocompreensão», de reflectirem sobre si próprias, para que se não fragmentem ou deixem cair na inércia administrativa. E sugere a construção de uma nova «gramática do bem comum», de uma política, redentora do espaço público, que será principalmente transnacional e cosmopolita. Apresentada como um caminho para salvar e dar substância à democracia. [Daniel Innerarity, O Novo Espaço Público. Trad. de Manuel Ruas. Teorema, 324 págs. Previamente publicado na revista LER.]

    Atualidade, Olhares.