Coimbra como destino

Fotografia de Daniel Palos

Um despacho da Lusa, veiculado por diversos jornais, divulgava há dias o impasse em que se encontra Coimbra como destino turístico. Apoiados num trabalho de investigação e em diversos testemunhos, os dados revelados não são muito animadores. No essencial, reconhecia-se um razoável aumento do número de visitantes, mas sublinhava-se também o facto de as visitas serem em regra de curtíssima duração, transformando a cidade num apeadeiro e não num destino. A situação traduz, como era de prever e se queixaram alguns dos entrevistados, uma escassa rentabilização do movimento de não-residentes, com um baixo número de dormidas, um impacto residual no comércio local e uma reduzida influência na atividade dos organismos vocacionados para a cultura e o lazer.

As razões não são estranhas a quem habita a cidade e está tão atento ao que nela acontece quanto ao que lhe falta. Sabe-se que há condições para a manter como espaço de interesse para quem a visita. Algumas são antigas: a centralidade na geografia do país, a acessibilidade fácil, a história longa e rica, o valor artístico e simbólico dos seus edifícios antigos, a beleza da sua orografia, serenamente projetada a partir do rio. E também, naturalmente, a Universidade, enquanto polo difusor do conhecimento e comunidade peculiar, associada, hoje como ontem, a uma vivência única. A classificação pela Unesco como Património da Humanidade ampliou o seu prestígio internacional e abriu perspetivas de desenvolvimento em condições de favorecer a cidade no seu todo. Ao mesmo tempo, um grande número de grupos e organismos culturais, alguns com largas décadas de atividade, oferece, mesmo com escassos meios e apoios, possibilidades que podem ser exploradas e estimular o interesse de renovados públicos.

No entanto, existe um obstáculo que limita o potencial de Coimbra como lugar de atração de visitantes temporários. O turismo vive essencialmente de estrangeiros, habitualmente em viagens curtas, sem vontade de permanecer numa cidade que não é uma estância de férias e pouco tem que justifique uma estadia prolongada. A solução está pois na procura interna, com capacidade para crescer desde que apoiada numa oferta própria, original, com o poder de conquistar um público pouco interessado em visitar repetidamente os mesmos espaços, alguns deles caducos e mal enquadrados, mas que pode ser atraído por atividades que justifiquem a deslocação. Não muito longe vai o tempo em que iniciativas bem programadas, como festivais, espetáculos e exposições no campo do teatro, da fotografia, das artes plásticas, da música, da poesia, traziam recorrentemente a Coimbra, em determinados períodos, bastantes pessoas em busca de atividades, regulares e de qualidade, que lhes preenchessem os interesses, colocando a cidade, de um modo destacado, no mapa cultural do país. Não existem razões para que tal não volte a acontecer.

A redenção de Coimbra, neste domínio, está pois no assumir da condição cosmopolita que, devido ao perfil sociológico de cidade maioritariamente de classe média, à formação qualificada da maioria dos que a habitam, e também ao seu lastro de experiência, pode reivindicar. Não no sentido de fazer o mesmo que outras cidades, repetindo fórmulas, mas afirmando-se por aquilo que tem de próprio e que pode desenvolver numa dimensão urbana, rasgada e aberta ao exterior. Libertando-se da nostalgia paralisante e autocontemplativa, por vezes de um doentio provincianismo apoiado num «excesso de tradição», que a afogam no seu próprio passado. Atraindo os outros, bem pelo contrário, pela sua modernidade e capacidade de reinvenção. E, por tal via, melhorando também a vida dos que a habitam o ano inteiro.

Versão revista de uma crónica publicada originalmente no Diário As Beiras.

    Cidades, Coimbra, Opinião.